09
de junho de 2012 | N° 17095
CLÁUDIA
LAITANO
Pais & filhos
Os
bebês invadiram o mundo – ou pelo menos o mundo virtual. Eles são onipresentes
nas redes sociais: bebês sorrindo, bebês chorando, bebês de roupa nova, bebês
tomando banho. Nunca participamos tanto da primeira infância alheia ou fomos tão
detalhadamente informados sobre rotinas que pouco ou nada interessam a quem não
é próximo da criança. Sua majestade, o bebê, é provavelmente o ser vivo mais
filmado e fotografado do planeta – seguido de perto por gatos fofinhos e a
realeza britânica.
Bebês
talvez sejam mesmo a face mais luminosa da existência. Onde mais, seja você o
Steve Jobs ou o vendedor de maçãs da esquina, seria possível encontrar uma
combinação tão magnífica de amor incondicional, possibilidades ilimitadas e
futuro a perder de vista? Não é à toa que os pais exibem as fotos de seus
filhos nas redes sociais como antigamente se compartilhavam cartões-postais das
pirâmides ou da Torre Eiffel.
Sim,
eles são lindos, sim, eles são amados, mas, mais do que isso, eles são um
instantâneo de um momento de plenitude em meio à inevitável imperfeição de todo
o resto. Quem tem um bebê em casa não está pensando no que ele já foi nem sabe
ainda o que ele será. O bebê muito desejado é um doce e prolongado presente,
nos dois sentidos. E estar “presente no presente”, dizem, é o mais perto da
felicidade que a gente consegue alcançar.
No
outro extremo desse presente sorridente e absoluto, encontram-se os filhos
encarregados de cuidar dos pais no fim da vida. Aqui é o peso do passado, tenha
ele sido feliz ou nem tanto, e a angústia em relação ao futuro que tomam conta
do dia a dia. O presente torna-se precário – e, em muitos casos, fisicamente
doloroso.
Perder
os pais, ou a sua lucidez, nos torna órfãos não apenas da companhia deles, mas
da alegre inconsequência de nunca pensar muito a sério na própria finitude. (Imaginem
que experiência transcendente essa que viveu a filha do Niemeyer, que morreu
esta semana, aos 82 anos, deixando o pai vivo e lúcido chorando por ela.)
Ao
contrário dos bebês, pais e avós não são exatamente um hit nas redes. Talvez
essas cerimônias privadas de adeus não caibam mesmo na superficialidade de um
tweet ou de um retrato de celular – embora experiências de dor, por mais
diferentes que sejam da nossa própria realidade, nos ensinem muito mais sobre a
condição humana do que os momentos de felicidade e plenitude alheios.
Nos últimos
dias, foram publicados dois belos textos sobre o assunto – dois relatos
corajosos e tocantes de filhos que perderam os pais. O primeiro, na capa da
revista Time desta semana, assinado pelo jornalista Joe Klein: “Como Morrer: o
que aprendi dos últimos dias dos meus pais”, em que o autor narra como
enfrentou a responsabilidade de ter que decidir sobre a vida e a morte dos pais.
O
outro, “O Cérebro do Meu Pai”, publicado na revista Piauí de junho e assinado
pelo escritor americano Jonathan Franzen – um dos grandes autores da minha geração
–, é provavelmente o texto mais comovente e profundo sobre a experiência de
conviver com um paciente de Alzheimer que eu já li.
Entre
outras coisas, Franzen revela que a excruciante experiência de ver o pai indo-se
aos poucos, paradoxalmente, o fortaleceu: “Tornei-me, no geral, um pouco menos
medroso. Uma porta ruim se abriu, e descobri que era capaz de atravessá-la”.
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