DANUZA
LEÃO
Entendendo o
outro
Nada
melhor do que não ter nenhuma responsabilidade pessoal e ter a quem culpar por
tudo que ocorre de ruim
Depois
que a psicanálise ficou ao alcance de todos, os filhos deitaram e rolaram nos
divãs para falar mal do pai e da mãe; sempre com razão, aliás, e sem o menor
resultado, aliás também.
Quem
são os culpados dos sucessivos casamentos que não deram certo? Os pais, é
claro. Ou porque não tiveram a coragem de se separar, mesmo vivendo mal, ou
porque se separaram, o que pode ter sido visto como modelo a ser seguido.
Se a
mãe foi uma mulher resignada, dominada pelo marido, que não lutou por sua
independência nem procurou o seu caminho, a filha pode se tornar uma adulta
igual ou virar o oposto: uma vadia que troca de homem como se troca de camisa.
Se
essas filhas tiveram um pai que era um marido exemplar, podem passar a vida
perseguindo a imagem paterna ou, ao contrário, um grande cafajeste, para serem
diferentes da mãe. Culpa de quem? Nem é preciso dizer.
Já
se o pai foi um derrotado que passou a vida infeliz no mesmo emprego medíocre
para dar segurança à família, os filhos podem no futuro ser ou exatamente
iguais ou fazer qualquer coisa para ganhar um dinheiro fácil, e terminar até na
cadeia. Em qualquer dos casos a culpa foi, é e será, sempre, dos pais.
Já
virou clichê o filho que passa a vida se lamuriando porque a mãe não contava
histórias na hora de dormir, e cujo pai nunca perguntava pelas notas do colégio
quando chegava do trabalho, e ai daqueles que saíam para uma festa quando os
filhos tinham uma febrinha.
Esses
passam a vida sofrendo, e sem razão, pois nada melhor do que não ter nenhuma
responsabilidade pessoal e ter a quem culpar por tudo que acontece de ruim. Mas
nunca nenhum deles parou para pensar como foi a vida desses pais quando
crianças. Como foi a infância deles? Feliz, traumática, triste, infeliz? Terão
eles recebido carinho dos seus próprios pais? Os analistas não costumam abordar
o assunto.
Houve
um tempo -algumas gerações atrás- em que as crianças, quando faziam uma coisa
errada, apanhavam. Quando pequenas levavam palmadas; já maiores, surra de
cinto. Hoje, ai dos pais que perdem a cabeça e cobram boas notas do colégio ou
levantam a voz.
O
caminho é só um: arranjar um psicólogo que as crianças frequentarão três vezes
por semana, além da reunião de família semanal, com o pai, a mãe, a atual
mulher do pai e o atual marido da mãe. Reuniões desse tipo não costumam acabar
bem, claro.
As
crianças modernas não estão interessadas em entender as razões que levaram suas
mães e seus pais a serem menos amorosos ou carinhosos; elas nunca pensaram que
a mãe, com 30 anos, mesmo adorando os filhos, às vezes sufocava quando via um
homem atraente, e que quando assistia a um filme romântico voltava para casa
querendo mandar tudo para o espaço e ir para algum lugar no mundo onde
encontrasse um homem que a olhasse como uma mulher ainda desejada.
Essa
mãe não conseguia nem ao menos entender o que se passava dentro dela; ficava
tudo muito confuso, e naqueles tempos não havia analistas para explicar o que
estava acontecendo (e se já existissem e explicassem, também não resolveria). E
qual o pai que um dia, mesmo amando apaixonadamente seus filhos, não pensou que
talvez ainda fosse muito jovem para tantas responsabilidades, e que teria sido
melhor se tivesse se casado um pouco mais tarde?
Ninguém
quer compreender as razões do outro, e ninguém está interessado em saber se
seus pais tiveram, dos seus pais e mães, o que gostariam de ter tido.
Porque
os pais e mães de nossos pais e mães também tiveram as suas razões, e o mundo
foi, é e será assim para todo o sempre -e amém.
danuza.leao@uol.com.br
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