sexta-feira, 27 de abril de 2012



A bela, a fera e o progresso numa fábula contemporânea

O Leão e a Joia, do poeta, dramaturgo e escritor nigeriano Wole Soyinka, nascido em 1934, Prêmio Nobel de Literatura de 1986, é, antes de tudo, uma fábula contemporânea que tem como cenário a pequena aldeia de Ilujinle, num país iorubá.

A publicação da peça teatral marca a estreia do autor no mercado editorial brasileiro. Na aldeia, a bela Sidi é disputada por um professor primário, Lakunle, treinado nos saberes ocidentais, disposto a erradicar a tradição e europeizar o ambiente e por Baroka, “o Leão”, sexagenário chefe da aldeia, disposto a casar com a jovem e manter o poder, a tradição e a linhagem de leão da mata. Sidi é a Joia do Vilarejo, sem dúvida um forte triângulo amoroso à africana, como verá o leitor.

A obra tem sido considerada uma pequena obra-prima do autor que foi o primeiro africano a receber o Nobel de Literatura e que até hoje escreve e critica duramente as ditaduras, a corrupção e a opressão que existem em cada canto de sua idolatrada África.

Com fino humor e muita irreverência, Soyinca, através das situações de conflito, mostra o jovem professor modernizador tentando convencer a amada a esquecer a tradição e o velho Baroka, de 62 anos, jogando com sua sabedoria ancestral para seduzir Sidi.

Baroka chega ao ponto de fazer circular uma falsa notícia sobre sua impotência sexual para depois convencer a pretendida de que o casamento com ela era uma prova para toda a aldeia da virilidade do velho leão e da possibilidade de manter o estado das coisas.

A peça pode ser lida também como uma busca de alternativas para as sociedades africanas no pós-colonialismo, mostrando que a mera substituição de brancos por negros nas mesmas estruturas de poder colonial fracassou.

A simples manutenção das culturas tradicionais não responde mais às necessidades e desafios da África contemporânea. A escolha de Sidi pode ser a saída para a incorporação de novos personagens sociais (a mulher, por exemplo), em processos de modernização que respeitem as identidades tradicionais.

Talvez aí resida o chamado “renascimento africano”. Valores africanos, costumes europeus, desejo de liberdade de mulheres, progresso, conservadorismo, apego às tradições e muita coisa mais estão nos vivos diálogos da obra. O texto tem apresentação do dr. Ubiratan Castro de Araújo, um dos maiores especialistas em cultura afro-brasileira, professor da UFBA e diretor da Fundação Pedro Calmon. Geração Editorial, tradução de William Lagos, 152 páginas, R$ 24,90, www.geracaoeditorial.com.br.

Jaime Cimenti

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