12
de agosto de 2013 | N° 17520
LIBERATO
VIEIRA DA CUNHA
Da alma
feminina
A
ciência mais complexa do universo não é a da Teoria dos Quanta. O mistério mais
indecifrável do mundo não são os caracteres gravados no alto da Pedra da Gávea.
O segredo mais indesvendável da Terra está longe de conter-se naquelas três
perguntas formuladas pelos gregos: Quem somos? De onde viemos? Para onde vamos?
Pois
não há teorema mais insolúvel do que a mente e o coração de uma mulher. Um dia
ela é explícito convite. No outro, calculada indiferença. Uma vez é a própria
face da sedução. Na seguinte, um criptograma. Volta e meia se faz próxima; nem
meia volta depois, tão distante como o sétimo planeta de Aldebarã.
Contam
que o Cavaleiro de Seingalt, mais conhecido como Casanova, era dono de métodos
irresistíveis de conquista. Falam que Don Juan conduziu ao êxtase 1.004 damas.
O que não esclarecem é que, nas memórias do primeiro, escritas no Castelo de
Dux, na Boêmia, lê-se sua irrealizada paixão por uma sóror portuguesa, para
sempre inalcançada. Ou que a vida do segundo se esfumou, no fundo do inferno,
depois de que tentou seduzir uma belíssima, casta deusa.
Nem
por sonho me imaginaria imitando esses dois senhores. Muito menos ousaria
aprovar um Medeiros de Albuquerque, hoje injustamente esquecido, que em suas
confissões narra o modo com que, vivendo em Paris em plena Primeira Guerra,
converteu (metido em um fardão da Academia Brasileira de Letras), Casanova e
Don Juan em singelos aprendizes, e ainda deu a receita de seu êxito com todos
os simplicíssimos detalhes.
Ocorre
que sou um ser monogâmico, ou seja, chacune à la fois, como diria em muito
melhor francês aquela éclatante Marion Cotillard. Mas conheço algo da alma
feminina. Eis por que arriscaria supor que o coração e a mente das mulheres são
complexos, indecifráveis, indesvendáveis, insolúveis, inalcançáveis,
intransparentes, tão só em razão de que guiados por um íntimo sonar,
transmitido a elas de geração em geração, desde o início dos tempos.
Esse
sonar as faz fingidoras, muito mais do que o Burlador de Sevilla, muito mais do
que Fernando Pessoa julgava os poetas e a si mesmo. Quando elas dizem não, na
verdade querem dizer talvez. Quando falam talvez, é um sim que nelas tenuemente
resiste, falsamente indeciso. Falam não, dizem talvez, porque esse é o modo
ancestral de se esquivarem, sua reação inaugural, atávica, ao convite da vida,
à intimação do amor.
E
por essa inconstância todos nós penamos. Elas, por um instintivo, imemorial
recato.
Nós
os homens, porque jamais aprenderemos a exata, inextrincável caligrafia de seu
pensar e sentir.
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