10
de junho de 2012 | N° 17096
MARTHA
MEDEIROS
O início da paixão é estratosférico
Gosto
demais do Fabricio Carpinejar, de quem tenho o privilégio de ser amiga. E é para
prestigiá-lo que abro essa crônica com uma citação extraída da ótima entrevista
que ele deu para a revista Joyce Pascowitch: “O início da paixão é estratosférico,
as pessoas não param quietas exibindo tudo que podem fazer.
Depois
passam a confessar o que realmente querem. A paixão é mentir tudo o que você não
é. O amor é começar a dizer a verdade”.
É mais
ou menos isso. No começo, a sedução é despudorada, inclui, não diria mentiras,
mas um esforço de conquista, uma demonstração quase acrobática de entusiasmo,
necessidade de estar sempre junto, de falarem-se várias vezes por dia, de
transar dia sim, outro também.
A
paixão nos aparta da realidade, é um período em que criamos um universo
paralelo, é uma festa a dois em que, lógico, há sustos, brigas, desacordos, mas
tudo na tentativa de se preparar para algo muito maior. O amor.
É aí
que a cobra fuma. A paixão é para todos, o amor é para poucos.
Paixão
é estágio, amor é profissionalização. Paixão é para ser sentida; o amor, além
de ser sentido, precisa ser pensado. Por isso tem menos prestígio que a paixão,
pois parece burocrático, um sentimento adulto demais, e quem quer deixar de ser
adolescente?
A
paixão não dura, só o amor pode ser eterno. Claro que alguns casais conseguem
atingir o Éden – amarem-se apaixonadamente a vida inteira, sem distinção das
duas “eras” sentimentais. Mas, para a maioria, chega o momento em que o êxtase
dá lugar a uma relação mais calma, menos tórrida, quando as fantasias são
substituídas pela realidade: afinal, o que se construiu durante aquele frenesi
do início? Uma estrutura sólida ou um castelo de areia?
Quando
a paixão e o sexo perdem a intensidade é que aparecem os pilares que sustentam
a história – caso existam.
O
que alicerça de fato um relacionamento são as afinidades (não podem ser raras),
as visões de mundo (não podem ser radicalmente opostas), a cumplicidade (o entendimento
tem que ser quase telepático), a parceria (dois solitários não formam um casal),
a alegria do compartilhamento (um não pode ser o inferno do outro), a admiração
mútua (críticas não podem ser mais frequentes que elogios), e principalmente, a
amizade (sem boas conversas, não há futuro).
Compatibilidade
plena é delírio, não existe, mas o amor requer ao menos uns 65% de consistência,
senão o castelo vem abaixo.
O
grande desafio dos casais é quando começa a migração do namoro para algo mais
perene, que não precisa ser oficializado ou ter a obrigação de durar para
sempre, mas que não pode continuar sendofrágil. Claro que todos querem se
apaixonar, não há momento da vida mais vibrante. Mas que as “mentirinhas” sedutoras
do início tenham a sorte de evoluir até se transformarem em verdades inabaláveis.
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