FERREIRA
GULLAR
Guerrear é
preciso?
A TV
mostra quarteirões transformados em ruínas por bombas e foguetes. Que sentido
tem isso?
Diante
das guerras que se travam hoje no mundo, sou obrigado a me perguntar por que,
depois de séculos de massacres, o homem continua, como nos primórdios da
civilização, a se armar e guerrear. Aliás, não apenas continua, torna-se mais
capaz de matar, valendo-se de armas cada vez mais sofisticadas.
Logo
me vem à mente a bomba atômica, que só não foi usada na escala que os
belicistas pretendiam, porque, neste caso, quase ninguém sobreviveria. E os
estadistas querem a guerra desde que ela não os atinja pessoalmente. Eles
decidem por fazê-la, mas quem morre são os soldados e o povo em geral. Os
chefões, quase nunca.
Costumo
dizer que frequentemente me surpreendo com o óbvio, e isso acontece agora,
quando a televisão me bombardeia diariamente com o número de mortos pelas
bombas e foguetes na faixa de Gaza, na Síria, na Líbia, no Iraque, na Ucrânia.
Surpreendo-me
com a quantidade de dinheiro que os países gastam com armamentos. E não só com
armamentos, mas também com as forças armadas. Todos os países têm
permanentemente centenas de milhares de soldados que constituem os efetivos
militares. Eles fazem parte do Estado, como elemento fundamental dele, e
constituem carreiras a que milhares e milhares de pessoas dedicam suas vidas.
Com
isso, gastam-se fortunas, com a finalidade de fazer guerra. Claro, se for
preciso. Mas a verdade é que essas forças são formadas e mantidas com essa
finalidade: a defesa da pátria pelas armas, se for o caso. E por que isso?
Porque a guerra é uma possibilidade permanente para os Estados, todos, sem
exceção.
Mas
por quê? Que os povos selvagens vivessem se matando, dá para entender. Por
exemplo, os índios do Brasil neolítico, que eram nômades, viviam do que colhiam
na natureza, eram obrigados a se deslocar para outras regiões em busca de
alimentos. Se houvesse outra tribo ali, a guerra entre as duas era inevitável.
Mas e hoje, por que a guerra?
As
razões são as mais diversas. Ou é um louco como Hitler, que sonhava dominar o
mundo, ou é concepção religiosa que leva líderes a atacar seus vizinhos, ou
disputa de mercado. Mas, depois de tanta guerra que já houve, por essas e
outras razões, resultando na morte de milhões de pessoas, parece que muito
pouco o homem aprendeu com isso.
É
certo que uma boa parte dos países --particularmente aqueles que sofreram na
carne as consequências das últimas guerras-- evita lançar mãos das armas para
impor seus interesses, mas mesmo estes continuam a produzir armamentos, cada
vez mais sofisticados e mais mortais. A cada dia surgem notícias de aviões de
guerra invisíveis aos radares, foguetes com velocidade e alcance inimagináveis,
armas essas que anulam qualquer possibilidade de defesa.
Que
significa isso, senão que a guerra é possível a qualquer momento, embora não se
saiba entre que países e por que razão? Para que aquelas armas sejam concebidas
e produzidas, os governos investem em pesquisa tecnológica e na formação de
cientistas que dedicarão sua inteligência, seus conhecimentos e sua vida a
produzir instrumentos de destruição. Mas não só os governos, há também empresas
privadas que investem em armamentos, que vendem para diferentes países e com
isso ganham fortunas. Muitos desses países mal têm recursos para atender as
necessidades básicas de seu povo mas, ainda assim, compram armas e mantêm
exércitos prontos para a guerra.
Desse
modo, a guerra, quer ocorra ou não, é fator importante da economia mundial.
Mesmo o Brasil, que não se caracteriza como um país belicoso, produz e vende
armas para outros países. Deve-se concluir, portanto que a hipotética
eliminação da guerra, por tornar a produção de armas desnecessária, não conviria
a esses países, mesmo porque conduziria a uma grave crise na economia em escala
planetária.
Isso,
portanto, está fora de cogitação. E a televisão, a cada momento, dia após dia,
nos mostra populações em pânico, mulheres desesperadas tentando escapar com seus
filhos, das bombas que explodem à sua volta. E mostra também quarteirões
inteiros de cidades transformados em amontoados de ruínas por bombas e
foguetes. Que sentido tem isso?
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