12
de agosto de 2014 | N° 17888
DAVID
COIMBRA
ONDE ESTÁ O
RONALD?
Tinha que falar com um cara chamado Ronald. Fui até o
prédio onde ficava seu escritório, numa cidadezinha perto de Boston. Na porta
de entrada estava pendurada uma placa onde alguém escreveu aquele nome:
“Ronald”.
Abri, entrei, caminhei até o balcão e disse: – Por favor, eu queria falar com o
Ronald.
As
pessoas se entreolharam. Ronald? Ninguém conhecia o Ronald. Fiquei perplexo.
Não conheciam? Mas aquele não era exatamente o escritório do Ronald? Foi o que
perguntei:
–
Escuta: esse aqui não é EXATAMENTE o escritório do Ronald?
Eles
balançaram a cabeça: não, não era o escritório do Ronald. Definitivamente. E
abaixaram suas cabeças americanas, voltando lá para as atividades americanas
deles, deixando-me brasileiramente boquiaberto à borda do balcão. Olhei em
volta. Vi uma porta de vidro em que havia outra placa na qual escreveram o
seguinte:
“Ronald”.
Com um milhão de MacDonalds, é lá que o Ronald está, pensei. E entrei por
aquela porta. Deparei com um sujeito com uns papéis na mão, caminhando pelo
corredor. Pedi licença e perguntei:
–
Por favor, onde eu poderia encontrar o Ronald?
Ele
pensou um pouco e, depois de alguns segundos, respondeu que ali não trabalhava
nenhum Ronald. Me deu um desespero. Por Deus. Por que ninguém queria me dizer onde
estava o Ronald? Será que o Ronald estava se escondendo de mim? Por quê? O
Ronald nem me conhecia.
Fora
ele quem, ao telefone, me dera seu endereço e dissera para eu ir até lá. Que
espécie de sacanagem era aquela? O que eles pretendiam, aqueles americanos?
Ronald! Cadê você? O que está acontecendo, Ronald? O que fizeram com você?
Ronald, apareça! Ronald!
Uma
senhora vinha de lá com um copo de papelão cheio de café. Interpelei-a,
tentando manter a calma:
–
Senhora. Por favor. Eu PRECISO encontrar o Ronald!
Ela
franziu a sobrancelha. Jurou que não conhecia nenhum Ronald. Então pedi
desculpas, pedi licença, sorry, excuse me, please, peguei-lhe pelo braço,
arrastei-a até a porta, abri e apontei para a placa:
–
Olha só: está escrito bem aqui que este é o escritório do Ronald. Lá fora tem
outra placa garantindo que aqui trabalha o Ronald. Eu mesmo falei com o Ronald
por telefone e ele disse que trabalhava aqui. Mas ninguém me diz onde acho o
Ronald!!!
Ela
começou a rir.
–
Claro! – concluiu. – Você está procurando pelo ROWLNALD!
E me
mostrou onde o desgranido se repoltreava.
Aí
está. Pronúncia errada. Para mim, Ronald era Ronaldo sem “o” no fim, e conversa
encerrada. Mas havia uma sutileza da língua inglesa para a qual não estava
preparado: para eles, a forma como pronunciamos o erre em Ronaldo, Ricardo,
Renato, Roberto e Ronald Reagan soa como agá. Honald, era o que eu dizia. E lá
não havia nenhum Honald, de fato.
Sutilezas,
pequenos detalhes, minúcias quase imperceptíveis fazem toda a diferença na vida.
Veja o time do Grêmio: tem bons jogadores, jogadores do nível dos demais
grandes times do Brasileirão, mas onde está a liga que fará dessa reunião de
jogadores um time?
Quem
os comandará? Lá estão um presidente que parece ter voltado ao clube por ressentimento,
um vice de futebol que parece não ter voz de comando no vestiário e um técnico
que parece sem a energia do passado. Falta liderança. Aparentemente, algo
minúsculo como dizer agá em vez de erre, mas, ao fim e ao cabo, é tudo o que
importa.
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