15
de agosto de 2014 | N° 17891
MOISÉS MENDES
Os homens bons
Um
dos grandes desafios do jornalismo, diante da morte de uma figura pública, é a busca
de um título definidor. Ariano Suassuna, por exemplo, foi contemplado com
dezenas.
Suassuna
ganhou títulos como mestre, mágico, mago, sol, alma brasileira. A literatura
facilitava a missão, mesmo com a tentação da obviedade. Mas o que dizer de quem
viveu tão pouco como político para, na hora da morte trágica, ganhar uma
definição categórica?
Na
quarta-feira, um colega percebeu que os sites não conseguiam, durante todo o
dia, produzir um título definidor de Eduardo Campos. Não havia o que dizer,
numa simplificação, digamos, poética ou política ou simplesmente humana. O que
poderia resumir Campos? Um homem bom, repetiam-se os comentaristas. E não havia
o que contestar.
Mas
é pouco, para um homem público, morrer como um homem bom. Campos seria então uma
esperança, uma promessa, o futuro, a renovação. Mas isso também é reducionista
e esquemático.
O
que fica agora para sempre como interrogação é a pergunta que o pernambucano
começaria a responder na campanha pela TV. Quem era Eduardo Campos? A terceira
via? A cara nova de centro-esquerda? O gestor? Também não diz muito.
No
que Campos era de fato herdeiro da vitalidade reformista do avô Miguel Arraes?
No que poderia ser um aliado do que ainda existe de mais reacionário no
Nordeste?
Fui
olhar o programa do PSB para a Presidência na internet. Programas são claros no
que dizem e no que escamoteiam. O programa do PSB esnoba, por exemplo, os que
reduzem a reconstrução do Estado “ao receituário minimalista do famoso choque
de gestão”.
Defende
a reforma política com a adoção de candidaturas avulsas e a ampliação de
instrumentos da democracia direta, como plebiscitos e referendos. Prega a
economia solidária, a revisão da “noção de progresso” (“agregando-lhe um
sentido mais humano”) e estabelece, desde o começo, que a base de tudo é o
desenvolvimento que respeita o ambiente.
No
que Campos e Marina combinavam nessas questões essenciais? O próprio Campos
admitiu, na última entrevista ao Jornal Nacional, que era duro o embate sobre
ambientalismo entre os aliados que estavam originalmente a seu lado e os que
faziam parte do grupo de apoio a Marina.
Está
dito no programa do PSB: “Nosso modelo de desenvolvimento (brasileiro) é
predatório e excludente, porque mina as bases naturais do próprio crescimento”.
Marina candidata pode radicalizar esse discurso?
Que
falta nos faz o Décio Freitas numa hora destas. Décio observava com uma visão
clássica a evolução do poder no Brasil. Um país teria de passar pelo comando de
reis, aristocratas, burgueses, fazendeiros, populistas, malucos, intelectuais e
operários, para experimentar a sensação de que evolui.
Décio
morreu antes de um salto drástico nesse quadro, a ascensão ao poder de uma
ex-combatente clandestina antiditadura. Eduardo Campos poderia, quem sabe, em
algum momento, ser parte desse esquema evolutivo. Mas qual seria o título?
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