25
de agosto de 2014 | N° 17902
ARTIGO
- POR PAULO BROSSARD*
GUISADO DE
TEMPO
No
longo período autoritário, foi imposto que dois, e apenas dois, seriam os
partidos, o que era um erro e uma violência. Embora os primeiros resultados
abonassem a novidade, era evidente que chegaria o momento em que a minoria se
converteria em maioria, em razão dos erros inevitáveis dos governos que se
prolongam por muito tempo. Não tendo como e onde votar senão em um dos dois
partidos permitidos, desse modo, roto estaria o sistema concebido para perdurar
pela eternidade.
As
diversas derrotas que abalaram o regime de então levaram os donos do poder a
tentar outro caminho, recorrendo aos recursos da bruxaria – um deles foi a
facilitação ao máximo da criação de partidos. Acreditavam que os interesses, as
paixões e o egoísmo das pessoas levariam à decomposição do espólio. A
consequência não tardou em externar-se: mais de 40 partidos foram criados, hoje
reduzidos a 32. E o resultado fala mais do que as palavras.
A
vida partidária e política teve progressos inegáveis, mediante aperfeiçoamentos
pontuais. Chegou ao momento em que se reivindicava aos partidos o acesso
gratuito ao rádio e à televisão, o que foi instituído e bem usado. Pois bem, o
número excessivo dos supostos partidos se encarregou de liquidar o progresso
havido.
E
agora eles são tantos que o tempo atribuído a cada um reduziu o benefício a um
guisado de tempo, destinado a fazer o preconício desse ou daquele candidato,
correndo-se o risco de tratá-lo como se fora um pastel ou um doce de coco –
partidos dos quais a maioria não sabe sequer a denominação, e desse modo o
benemérito acesso ao rádio e à televisão se transformou em êxito simbólico.
Em
verdade, uma novidade que surgiu como utilidade inegável converteu-se em
máscara vazia de sentido útil. E assim, instituições conservam o nome, perdendo
seu conteúdo. Enquanto a presidente da República, mediante aquisição do tempo
de vários partidos minhocas desfruta de quase 13 minutos, o comum dos mortais
vegeta com pílulas de alguns segundos, chegando ao ponto de o tempo acabar
antes de a frase chegar à metade.
*Jurista,
ministro aposentado do STF
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