29
de agosto de 2014 | N° 17906
MOISÉS
MENDES
Pesquisas e
salsichas
Eu
não contribuo para a democracia, para a aprovação de novos produtos e para a
aferição do estado de espírito dos brasileiros, quando o assunto é pesquisa.
Nunca fui pesquisado.
Nunca
me ouviram para saber em quem vou votar, se aprovo o gosto do novo chá de
acerola ou se estou otimista com o Brasil. Nunca fui ouvido nem para saberem se
concordo com a separação de Zezé di Camargo e Zilu.
Pesquisas
orientam quase tudo. O candidato a governador de São Paulo pelo PMDB, Paulo
Skaf, só falou a palavra tesão num programa de TV depois que os marqueteiros
testaram, com pesquisas, se o eleitor aceitaria bem a expressão.
Os
paulistas ouviram Skaf, um empresário sisudo, falando tesão e pensaram que o
homem é jovial e descolado. Não necessariamente. Os marqueteiros é que
decidiram que ele deveria falar a palavra para parecer descolado.
Você
acredita em tudo que é pesquisa? Acredita nas pesquisas que apontam tendências
do eleitorado? Esse tal retrato do momento da intenção de voto, consagrado
pelos americanos e praticado em todas as democracias. Você acha que isso tem
fundamento?
O
sociólogo Mauro Paulino, diretor de um dos mais respeitados institutos de
pesquisas do país, o DataFolha, acha que sim. Desde que as pesquisas sejam do
próprio DataFolha.
Paulino
foi entrevistado esses dias pelo programa Roda Viva, da TV Cultura de São
Paulo. Perguntaram bem assim a ele: você confia nos resultados de todas as
pesquisas feitas pelos institutos brasileiros mais conhecidos?
A
resposta, entre aspas, foi exatamente esta: “Não! Confio nas pesquisas do
DataFolha. E tenho enorme respeito pelo Ibope”.
Paulino
só confia nas pesquisas coordenadas por ele e tem respeito por outro instituto.
Não precisa ser dicionarista para interpretar o sentido de cada palavra.
Confiar nas pesquisas é uma coisa. Respeitar um concorrente que faz pesquisas é
outra. E se ele tivesse dito o inverso (o que não diria): que admira o seu
DataFolha e confia nas pesquisas do Ibope?
Nenhum
dos seis jornalistas presentes levou a questão adiante. E ficou por isso mesmo.
Mas, enfim, o que uma pesquisa pede é o que Paulino diz ter apenas no seu
instituto: confiança.
Se
nem o diretor do poderoso DataFolha confia no que os outros fazem, fica difícil
pedir confiança ao eleitor. Você é anistiado de todas as vacilações sobre
pesquisas e pode levar adiante, com o aval de Paulino, suas dúvidas sobre essa
amostragem do Ibope que mostrou a disparada de Marina Silva.
O
Ibope que Paulino admira está certo ou o DataFolha e outros institutos
aparecerão daqui a alguns dias com algo bem diferente? A pesquisa CNT/MDA veio,
na quarta, com números semelhantes aos do Ibope.
O
interessante disso tudo é que Paulino deve ter os mesmos receios de um dono de
laticínio. Quem beberia o leite que o outro produz? Quem sabe qual é o leite
que não tem soda cáustica? E quem, entre os fabricantes de embutidos, comeria a
salsicha alheia – ou a própria salsicha?
O
DataFolha é uma empresa do Grupo Folha. E a Folha de S. Paulo deu de manchete,
na quarta-feira, a pesquisa do Ibope com a vitória de Marina no segundo turno.
A Folha confiou no Ibope.
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