sábado, 23 de agosto de 2014


24 de agosto de 2014 | N° 17901
L. F. VERISSIMO

O Álvaro insistiu,

Insistiu e finalmente convenceu o amigo a acompanhá-lo a uma academia de ginástica. O amigo – Rubens – andava deprimido. Acabara um namoro por uma bobagem, uma briga sobre a Marina Silva. Segundo Álvaro, nada acabava com a depressão como uma esteira.

O Rubens ainda resistiu. – Esteira? Eu tenho um infarto. – Tem nada. – Eu não aguento dois minutos.

– Aguenta. – Sei não... – Vamos lá. Na academia, você conhece gente. Tem mulheres sensacionais. Pode até pintar um namoro, pra você esquecer a Norminha.

– Será? – Vamos lá! – Se eu morrer nessa esteira, você me paga.

– Você não vai morrer. Vai se exercitar. Vai cansar no começo, vai ter dor no corpo... Depois só vai pensar no seu corpo e esquecer todo o resto. Inclusive a Norminha. – Você garante?

– Por que você acha que as pessoas vão à academia? Pela ginástica, claro. Para emagrecer, ficar em forma, tudo isso. Mas principalmente para se concentrarem no próprio corpo e esquecerem todo o resto. O que são exercícios senão gestos repetidos, como os mantras que as pessoas entoam para não pensar, para ultrapassar o pensamento e tudo ao que o pensamento induz, como a angústia? E a depressão?

– Se você diz...

– E vou dizer mais. Sempre achei seu relacionamento com a Norminha meio doentio. Uma obsessão, isso. Não era amor, era mania. Você precisa se libertar da mania da Norminha e recuperar sua mente, esvaziando-a. E só há um lugar para isso.

– Qual? – Uma esteira.


O Rubens não morreu na esteira mas, no primeiro dia, caiu e quebrou o nariz. Quando soube do acontecido, a Norminha correu para o seu lado, aflita, e os dois se reconciliaram, prometendo nunca mais discutir sobre política.

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