02
de julho de 2014 | N° 17847
MARTHA
MEDEIROS
Um beijo só
Duas
retas finais: a da novela Em Família e a da Copa do Mundo no Brasil. Acompanho
as duas. A novela das nove, comecei a assistir pra valer só no último mês, e
façamos justiça ao autor Manoel Carlos: a audiência pode não ser a esperada,
mas é uma delícia ver diálogos hiper-realistas e cenas domésticas que se
desenrolam num ritmo muito parecido com o nosso, nos dando a possibilidade de
sermos voyeurs olhando pelo buraco da fechadura de portas alheias. Me divirto,
relaxo, esqueço da vida.
Só
uma coisa me aflige, não sei se quem assiste à novela também percebeu: alguns
personagens dão três beijinhos quando se encontram. Três. Será o novo modismo
da zona sul carioca? Fiquei nervosa, confesso.
Logo
agora, quando estamos observando um avanço aqui no Sul: o fim dos dois
beijinhos. Não sei como essas coisas iniciam, quem introduz, como pega, mas
agora, na capital dos gaúchos, a gente está fazendo como os paulistas, dá um
beijo só e basta.
Gosto
de simplificações. Gosto de tudo que é enxuto, econômico, objetivo. Poucos
meses atrás, estive em São Paulo visitando uma amiga e ela me apresentou sua
turma, e saí tascando dois beijos, um que era retribuído e outro que ficava no
ar, porque acostumados com um só, os paulistas logo afastavam suas suculentas
bochechas depois do primeiro, fazendo com que eu parecesse uma caipira. Oh,
infernais dois beijos, para que o excesso?
Pois
agora, para complicar, vem a novela das nove lançar três beijinhos. Tem gente
que ficou apreensivo com o insosso beijo gay da Clara e da Marina, mas
escandalosos mesmo são os três beijinhos entre a Helena e a Shirley. Vamos nos
preocupar com coisa séria, por favor.
Não
suporto dar três beijos, mas dou quando não há a mínima chance de fuga. Três
beijos é um exagero, porém não se sintam menosprezados os que possuem o
costume, pois na aristocrática Suíça se dá o mesmo. Três beijos. Por que
motivo, não sei.
Mas,
excetuando-se a Suíça, o interior do Rio Grande do Sul e os estúdios do Projac,
a tendência mundial é a da subtração, os modos se refinam. Me garantiram: em
Porto Alegre não se dá mais dois beijinhos. É um só.
Saiu
no Diário Oficial?
Um
beijo só, aleluia. Tenho dúvida se a ideia já está disseminada, mas diante do
desserviço da novela global, ofereço minha contribuição com essa crônica,
apoiando. Um único beijo é a elegância da economia. Um único beijo é suficiente
para demonstrar nossa simpatia. Um beijo rápido, talvez com o adendo de um
abraço nos casos mais íntimos e em situações calorosas, e estaremos todos
devidamente cumprimentados.
Antes
que me perguntem: no ombro, de preferência, nenhum. E mordida, só entre
lençóis.
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