sábado, 26 de julho de 2014


27 de julho de 2014 | N° 17872
CÓDIGO DAVID | David Coimbra

Você sofre de ansiedade de banheiro?

Estava no supermercado, no corredor dos itens para banho e limpeza, e vi aquela mensagem. Era um texto escrito num pacote de rolos de papel higiênico. O título capturou a minha atenção, como devem fazer os bons títulos. Numa tradução livre, perguntava-me assim:

“Você tem ansiedade de banheiro?” Hein?

Li a linha abaixo. Nova pergunta:

“Você está se sentindo como se jamais fosse encontrar o papel higiênico perfeito?”

Olhei para dentro de mim mesmo. Para minh’alma. Fiz um questionamento silencioso. Estaria eu em busca do papel higiênico perfeito? Nunca havia pensando nisso nesses termos, mas, sim, concordei: eu queria o papel higiênico perfeito. Agora, querendo-o, achava que poderia encontrá-lo ou, como dizia o texto, sentia-me como se ele não existisse? Refleti mais um pouco, parado ali, diante da estante, e balancei a cabeça: era verdade, sentia-me como se nunca pudesse encontrar tamanha perfeição.

Fui em frente. Havia uma descrição do tão almejado papel higiênico perfeito:

“Um que deslize do rolo com graça e estilo”.

Eu queria isso? Graça e estilo em meu papel higiênico? Sim. Sim! Definitivamente sim. Parecia maravilhoso.

Prossegui.

“Relaxe”, tranquilizava-me o redator. “Sua busca acabou”. Por quê? Porque aquele papel higiênico que tinha em mãos, chamado de “Super Soft”, possuía o poder de fazer as minhas ansiedades derreterem. Era isso que ele fazia: derretia ansiedades.

“O Super Soft faz jus ao nome que leva e é uma garantia de, com seu uso, trazer um sorriso para o seu rosto”, prometia-me a embalagem, encerrando com uma espécie de repto: “Não leve em conta o que dizemos. Leve esse rolo miraculoso para casa e experimente!”

Oh, Super Soft!

Levei-o para casa. Ele me traz, diariamente, um sorriso com seu uso.

Ah, o poder dos publicitários americanos.

ANSIEDADE ÉTNICA

Você tinha de ver os negrões americanos dançando. Aliás, aqui nos Estados Unidos você não pode nunca chamar um negro de negro. É afroamericano MESMO. Chamar um negro de negro pode dar processo e tudo mais.

Mas, francamente, chamar um negro de afroamericano é que me soa preconceituoso, por causa da falta de naturalidade da coisa. Como é que vou descrever Pelé como “um afroamericano forte, de 1m73cm de altura, que chuta bem com ambas as pernas”? Qual é o problema com “Pelé é um negro forte, de 1m73cm de altura, que chuta bem com ambas as pernas?” Onde está a ofensa?

Mas, está certo, se algum negro brasileiro me disser para chamá-lo de afroamericano, chamo. Respeito suscetibilidades. Aqui, pelo menos, tem de ser assim. Então:

Você tinha de ver os afroamericanos dançando. Vi, no Quincy Market, uma manhã dessas. É mais do que dança, é malabarismo. Um show criteriosamente ensaiado em que nada dá errado. Os caras se contorcem no chão como serpentes com coceira, saltam como cabritos monteses, parece que os ossos deles são feitos de geleca. E depois passam o chapéu para recolher os dólares da assistência. Dólares, dólares. Tudo está bem, tudo está certo na América, se você tem dólares.

ANSIEDADE CLIMÁTICA

Neste momento em que escrevo faz 90 graus Fahrenheit. Como é converter isso para Celsius, que é muito mais civilizado? Ninguém sabe ao certo. Há várias maneiras de calcular. Uma delas:

Pegue a temperatura Fahrenheit. No caso, 90.

Subtraia 32. Resultado: 58.

Divida por 9. Resultado: 6,4.

Multiplique por 5. Resultado: 32.

Aí está: 32 graus Celsius.

É quase isso. Na verdade, 90ºF dá 32,22222222222222222222222222222ºC.


Uma droga. Nunca sei que temperatura está fazendo. Essa incerteza pode perturbar um homem, pode acabar com ele. Sim, senhor.

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