10
de julho de 2014 | N° 17855
LUCIANO
ALABARSE
BETHÂNIA AINDA
MELHOR
Disco
novo de Bethânia é sempre um acontecimento. Meus Quintais, recém-lançado, é
excepcional. Requintado. Bonito. Essencial. Parece que minha baiana preferida
abriu mão da urgência temporal. Acima de modismos e tendências, seu canto
aponta um Brasil musical consistente. E se, como eu, você não aguenta mais o
barulho estridente dos artistas de ocasião, canções que não resistirão ao
próximo verão, ouça Uma Iara, que funde Adriana Calcanhotto com Clarice
Lispector, para entender meu entusiasmo. Esses dias, aliás, Adrix me perguntou
a sério: “Para onde vai Maria Bethânia?”. Não sei, mas, onde ela estiver,
estarei lá.
O
que tinha de ser: uma cantora muito jovem se apresentava em Salvador, em 1964,
acompanhada dos conterrâneos que mudariam a história da música brasileira,
quando o produtor do espetáculo
Opinião
a assistiu e a recomendou para substituir Nara Leão no histórico espetáculo
carioca. Destino e predestinação. Cinquenta anos depois, Bethânia reluz no auge
de sua carreira vitoriosa e única. Sempre que está em Porto Alegre, junto com
Tânia Carvalho, partilhamos gargalhadas e lágrimas.
No
Barranco, bebendo cerveja quente depois de um show problemático, sentado entre
ela e Mísia, a fadista portuguesa, chorei de rir ouvindo uma conversa das duas
divas sobre o tamanho do pau dos homens japoneses, impublicável num jornal de
família. Mísia, à época casada com um, garantia plena satisfação contra
propagandas enganosas.
Oblíqua
e incandescente, Maria Bethânia é associada às paixões desmedidas, mas,
asseguro, seu bom humor é contagiante. Canta hinos do futebol brasileiro, conta
piadas, ri alto. Num episódio recente, quiseram tratá-la como aproveitadora de
verbas públicas. Fiquei indignado como poucas vezes na vida, e muito grato ao
Jorge Furtado, que usou seu prestígio nacional para defendê-la. Ferreira Gullar
também. A acusação ridícula passou. Sua mágoa, não sei.
As
célebres corridinhas que marcaram boa parte de suas performances hoje se
transformaram em gestos elegantes e controlados. Senhora dos raios, dona do
palco, sua voz, como vinho, está melhor que antes. Sempre dou vexame nos
espetáculos da Abelha Rainha. Começo a chorar e não paro. A única vez que ousei
lhe dizer “não” foi quando me pediu que lhe ensinasse a cantar Prenda Minha.
Eu, cantar para Maria Bethânia? “Nem morta!”, como diria o mano Caetano.
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