15 de julho de 2014 | N° 17860
FABRÍCIO CARPINEJAR
Escorpiões disfarçados de siris
Raros são os que guardam segredos. Raros e invioláveis.
A maior parte dos amigos revela nossos segredos não por
maldade, e sim por incompetência, absoluta inabilidade para a discrição e o
respeito.
Nem são fofoqueiros, é que não conseguem conservar uma
promessa e contam nossos segredos em forma de segredos para seus amigos
guardarem segredo. Vão passando o segredo adiante, jurando que os demais serão
capazes de sigilo (se nem eles que são próximos da fonte cumpriram a palavra, o
que dirão aqueles que são distantes, sem nenhum compromisso?).
E muitos partilham com a esposa ou o marido, alegando que
são a mesma pessoa e que não tem como esconder nada dentro do casamento. Não
absorveram a lição básica de que segredo é prato individual, não é porção para
dois.
Tudo bem, já perdoei essas figuras, esses escorpiões
disfarçados de siris, esses conselheiros com complexo de agência de notícia.
São confiáveis, mas fracos.
São leais, mas carentes.
São honestos, mas burros.
São bem-intencionados, mas influenciáveis.
É necessário inteligência para se esquivar da curiosidade
alheia, suportar a pressão, rechaçar perguntas, não entregar o assunto com
insinuações, ambiguidades e caretas.
O segredo é a prova de QI da Amizade.
O confidente deve amar seu temperamento, não ser
preconceituoso, careta e teimoso, e protegê-lo nas mais diferentes combinações
sociais.
Tenho amigos maravilhosos, divertidos, carismáticos, só que
não posso abrir nenhuma confidência para eles, já percebi que vacilam e sofrem
de incontinência verbal. E jamais assumem a gravidade de dar com a língua nos
dentes. Arrumam desculpas para romper o pacto de silêncio. Ainda se acham
certos.
Divido os falastrões em três categorias:
Falso generoso: usa o pretexto de que estava preocupado com
você e não poderia conter a informação.
Inconsequente: limitado, não calcula os desdobramentos de
seus atos, não compreende que segredo não é segredo por charme, é porque ainda
não se está maduro para revelá-lo a todos, há grandes chances de estragar ou
interferir na realidade.
Moralista: emprega o artifício de que abriu a boca porque
não sabe mentir. Além de jogar no ventilador sua intimidade, ainda – por tabela
– atingirá sua honra e lhe acusará de mentiroso.
Depois de muito penar, vejo que manter segredo é uma vocação
sublime.
Escolher um confidente é tão difícil quanto encontrar o
verdadeiro amor. Será um por vida, não mais que um.
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