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sábado, 13 de setembro de 2008
14 de setembro de 2008
N° 15726 - MARTHA MEDEIROS
O sempre no nunca
Vivemos num mundo de variados prazeres mundanos, sensoriais, transcendentais, mas poucos são tão valiosos quanto ler um livro bom. O que vem a ser tal coisa?
Cada um tem seu conceito sobre livro bom. Os meus livros bons são aqueles em que eu não consigo parar de sublinhar trechos. É aquele que me faz ter vontade de voltar logo pra casa e me enfiar na cama com ele. É o livro que já começa a me dar saudades antes mesmo de acabá-lo.
E quando termino, em vez de pegar outro, quero começar a lê-lo outra vez. Fantasma Sai de Cena, de Philip Roth, não foi pra mim um livro bom, foi fora de série.
O que escolher para ler em seguida e não deixar o êxtase se esvair? Peguei A Elegância do Ouriço, da francesa Muriel Barbery. Não chega a ser um Roth, mas é um livro especial.
Duas narradoras que moram num mesmo prédio elegante de Paris: uma é a zeladora, que é culta, mas para os inquilinos se faz de ignorante, porque é isso que os esnobes que moram lá esperam de uma zeladora (são impagáveis os momentos em que ela se esforça para falar errado de propósito,
pra não dar pinta da sua erudição), e a outra é uma espertíssima menina de 12 anos, filha de um deputado e de uma dondoca, e que despreza o universo fútil em que vive.
Em algum momento, claro, essas duas avis raras que habitam o mesmo endereço francês irão se cruzar, mas, até lá, nos oferecem uma narrativa deliciosa, cada qual na sua. Quando finalmente se encontram na história, bom, aí fazem a festa do leitor.
É um livro filosófico, inteligente e engraçado. Desconstrói certas verdades estabelecidas e, de lambuja, ainda reserva um pouco de poesia nas últimas páginas.
Ou muita poesia. Diante da dor dilacerante, o que buscar? O belo. Diante do impossível, diante de uma vida inútil, diante daquilo que não aconteceu nem acontecerá, o que nos compensará?
Um único instante sublime. Em todo “não”, há um filete de “sim”. Em toda descrença, há uma possibilidade de certeza. É o que a autora chama, no livro, de “o sempre no nunca”.
Basta a lembrança de um piano que tocava em determinado momento de angústia, basta um pedaço de pano colorido que se destacou na hora de reunir as roupas de um morto, basta uma frase especial de uma amiga quando a noite prometia ser um suplício, e a nossa desilusão eterna se atenua.
Para a maioria das pessoas, os dias correm e parece que os sonhos nunca se realizarão. Nunca.
Mas em meio a esse nunca, há de ter um pedacinho afetivo de sempre. Aquela lembrança, aquela foto, aquela música, aquele instante que ficou alheio ao tempo, imortal.
O sempre no nunca. Há em tudo, basta um pouco de doçura para reconhecê-lo.
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