terça-feira, 16 de setembro de 2008



16 de setembro de 2008
N° 15728 - LUÍS AUGUSTO FISCHER


A tradição, mas também a cidade

A coisa anda do seguinte jeito:

dirigindo eu distraído por uma avenida da cidade, de repente meu olho é convocado por uma propaganda imensa, uma das tantas que afirma seu amor pelas coisas da tradição, do Rio Grande, dos valores farroupilhas etc. – mas a assinatura é de uma conhecida cadeia de lojas populares batizada com o nome de um Estado nordestino.

Se explica porque estamos na antiga Semana Farroupilha, agora Mês Farroupilha, talvez tendendo ao Semestre Farroupilha e assim por diante, até chegarmos ao que seria, pelo jeito, a utopia realizada, um Eterno Farroupilha, todo mundo acampado o tempo todo, sem parar nunca mais, pilchado, churrasqueando e vendo cavalo no parque da Harmonia.

Enfim, ficou aquele paradoxo na minha retina: amor pelo Rio Grande, declarado pelas Casas Bahia. Tá certo, qualquer um pode amar o que quiser, na minha república ideal;

mas nem por isso se ameniza esta cada vez maior enxurrada de declarações de apreço pelas tradições, sem qualquer menção de gosto ou, pelo menos, respeito pelas inovações, pela mudança. No plano filosófico, eu preferiria um equilíbrio maior entre as duas pontas da dinâmica da vida.

Sem nenhuma relação mais sólida com isso, me ocorre evocar aqui um romance que vale a pena ler. Chama-se À Mão Esquerda, e seu autor é Fausto Wolff. Aliás, era, eis que faleceu faz uns dias.

Era gaúcho de nascimento e formação inicial, uma figura saliente em minha formação de leitor no antigo Pasquim, onde ele, retornando de temporada européia de exílio para sair de perto do horror da ditadura militar,

escrevia sobre sexo e várias outras coisas. Tinha um texto fluente, não particularmente virtuoso mas muito eficaz, que de algum modo imantava o leitor.

O citado romance tem vários méritos, mas, já que estamos mergulhados no elogio a uma parte da tradição, evoco aqui outra parte: Fausto Wolff bota em cena, com grande destreza, figuras e paisagens da Porto Alegre do tempo de sua juventude.

E é um grande prazer encontrar em suas páginas a Floresta, o Mont’Serrat, o Moinhos de Vento e outros ambientes desta terra, cujas tradições também são urbanas e imigrantes, ligadas com a modernidade.

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