segunda-feira, 29 de setembro de 2008


MOACYR SCLIAR

A complicada vida dos pombos

Andei por vários lugares, e de todos fui expulso por causa de guerras; chamavam-me de Pomba da Paz

Pombo-correio que errou endereço sofre rejeição nos EUA. Um casal da cidade de Manchester, em New Hampshire (EUA), está tentando descobrir o que fazer com um pombo-correio que foi parar na casa errada -a deles.

Por uma fita de identificação, Don e Fran Roy rastrearam a origem da ave, que ganhou o nome de Trouble (Problema), e chegaram a um homem que participa de campeonatos de pombos-correios.

Mas Dan Sizczynski, de Dingmans Ferry (Pensilvânia), afirmou que o animal foi um dos vários que ele doou após o fim dos campeonatos. O casal contatou diversas entidades protetoras de animais, mas ninguém quis Trouble. "Estamos preocupados com ele", afirmou Fran.

Nas duas vezes em que tentaram soltar a ave, ela deu a volta e retornou à casa. Por enquanto, o pombo dorme sob a cobertura da porta da frente. Ele é alimentado com comida para pássaros e água. Enquanto não é acolhido por alguém definitivamente, Trouble começa a se sentir em casa com os Roy.

O cachorro do casal já o trata como membro da família. Folha Online Aves atacam moradores para defender território nos EUA. Especialistas têm alertado os moradores de Chicago (EUA) para que tomem cuidado com os pássaros.

O comportamento extremamente territorial dos pássaros conhecidos como tordos-sargentos está causando muitos incidentes na cidade. As aves intensificaram suas investidas sobre a cabeça das pessoas, como se estivessem no célebre filme "Os Pássaros" (1963), de Alfred Hitchcock. Folha Online

OS DOIS POMBOS se encontraram por acaso, na residência em que um deles tinha buscado abrigo. Começaram a conversar, na linguagem dos pombos -arrulhos, tristes arrulhos- e logo estavam trocando mútuas confidências.

O primeiro pombo, morador da casa em que estavam, relatou as desventuras pelas quais passara, depois que seu dono, um homem chamado Dan, tentara livrar-se dele, mandando-o embora: -Cheguei a esta casa, avistei o casal de proprietários, simpatizei com eles e tentei fazer com que me aceitassem como ave de estimação.

Foi muito difícil. Tudo o que queriam era mandar-me embora. Chegaram a entrar em contato com o Dan, que se negou a aceitar-me de volta.

Falaram com supostas associações protetoras de animais e também não obtiveram apoio. Enquanto isso eu voejava aqui pelas redondezas, desesperado e revoltado. Cheguei a pensar em imitar aqueles tordos-sargentos que se unem e atacam os habitantes de Chicago -como no filme do Hitchcock, sabe?

Eu convocaria os irmãos pombos, formaríamos um grupo revolucionário com um lema tipo "Pombos de todo o mundo, uni-vos, nada tendes a perder a não ser as gaiolas", e partiríamos para o ataque. Mas a verdade, amigo, é que nós, pombos, não damos para isso, não somos belicosos.

-Eu que o diga -suspirou o segundo. Já andei por vários lugares, e de todos fui expulso por causa de guerras. Estive no Afeganistão, estive no Iraque, estive em Darfur, estive na Georgia, estive na Bolívia...

Esse pessoal me expulsa, sabe? Como se eu fosse uma ave agourenta. Não querem nada comigo.

-É verdade. Eles não gostam da gente. Olhe só o nome que me deram: Trouble, problema. Isso é nome, meu amigo? A propósito, como você se chama?

-Eu não tenho nome -sorriu a ave, tristemente. -Mas, antigamente, costumavam me chamar de Pomba da Paz.

MOACYR SCLIAR escreve, às segundas-feiras, um texto de ficção baseado em notícias publicadas na Folha

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