sábado, 27 de setembro de 2008



27 de setembro de 2008
N° 15741 - PAULO SANT’ANA


O sono na direção

Repercutiu bem a coluna de ontem, quando aconselhei a todos os passageiros de ônibus que conversem com o motorista durante o trajeto.

Não deu outra: o motorista do caminhão que ia em direção ao Chuí e bateu no ônibus depôs ontem que dormiu muito pouco antes da viagem.

Foi o que calculei: quem está na estrada às 6h da manhã, seja no fim ou no início do trajeto, em qualquer caso está com sono: por não ter dormido ainda ou por ter dormido pouco antes de sair.

Sei porque já senti sono dirigindo em viagem turística. E teimosamente queria levar a viagem adiante. Outras vezes foi tão nocauteador o sono, que parei à margem da estrada e dormi por cerca de uma hora.

Imaginem o caso dos caminhoneiros e dos motoristas de ônibus que são obrigados a cumprir o trajeto dentro de determinado horário, não podem parar para dormir. O sono se torna fatal.

Quantas e quantas vezes os motoristas param em postos de gasolina para molhar o rosto e os olhos, com a finalidade de afastar o sono!

Esta sacada que tive de pregar que se converse com o motorista, ao contrário do que pedem os cartazes, me surgiu quando analisei o mais famoso dos soníferos vendidos em farmácia: o Dormonid (receituário azul).

O Dormonid serve também como anestésico nos hospitais. Fui ler a bula do Dormonid: este poderoso remédio para dormir nada mais é do que um inibidor da memória.

Ou seja, nós só não dormimos porque estamos com a memória a funcionar. Se estancarmos a memória, entramos em sono profundo.

Por isso é que, concluo eu, quando temos um problema grave para resolver, não conseguimos dormir. Ou seja, pensamos fixamente no problema, o que quer dizer que nossa memória está trabalhando, em atividade intensa.

Em vista disso, aconselhei que se converse com os motoristas, enquanto eles estão dirigindo, isso estimula o seu raciocínio e espanta o sono.

“Distraia o motorista”, ordenei eu. Quando uma anencéfala idéia corrente quer o contrário, que o motorista não se distraia, nem com o cigarro, mandam os idiotas.

Nada disso, o rádio no veículo é permitido para distrair o motorista. E enquanto estiver distraído, isto é, ouvindo rádio, fumando, conversando, o sono não ataca o motorista.

Às vezes penso que o meu ofício na vida é pensar.

Olhem o que me mandou dizer este leitor: “Bom dia, Sant’Ana. Esta é a primeira vez que me atrevo a enviar um e-mail a você, mas nunca ninguém teve coragem de escrever o que fez você fez ontem com tanta perfeição sobre o que se passa com um motorista de ônibus ou caminhão quando está na solidão de sua cabine.

Fui caminhoneiro durante 13 anos e sei muito bem que o silêncio de uma cabine é um convite ao sono, tudo o que pode ser feito para ‘distrair’ o motorista é sempre válido. Parabéns. (ass.) Gilberto Borelli. Tramandaí – RS”.

E esta outra leitora: “Prezado Paulo Sant’Ana, tenho uma relação de amor e ódio contigo, pois às vezes odeio o que escreves, principalmente em relação ao cigarro, que está te matando. Às vezes amo o que escreves (na maioria das vezes). Acabei de ler o teu artigo sobre conversar com o motorista na estrada.

Este é o meu lema quando viajo com alguém. Jamais durmo enquanto o motorista dirige, converso coisas amenas, pergunto se está com sono, olho discretamente para o seu lado para ver se está tudo bem.

Dirijo, sem interferir, ou seja, cuido a estrada junto com ele, procurando não dar palpites que possam prejudicá-lo na direção.

Ao contrário, os outros acompanhantes só sabem dormir, chegam a roncar, sem a menor preocupação. Parabéns pelo artigo e um abraço. (Ass.) Silvia Mucillo (silviamucillo@yahoo.com.br)”.

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