terça-feira, 11 de junho de 2013


11 de junho de 2013 | N° 17459
CLÁUDIO MORENO

A verdadeira esfinge

A esfinge grega nada tem a ver com a sua homônima do Egito, que é mansa como um grande gato doméstico. Diferentemente das harpias, das sereias e das górgonas, a esfinge de Édipo é a única de sua espécie e só atua neste mito. Sua aparência sugere as colagens cubistas de Picasso: cabeça e busto de mulher, corpo de leão e asas de águia.

Diante das portas de Tebas, esta criatura fantástica propunha um enigma a todos os jovens que chegavam à cidade e devorava os que não conseguiam decifrá-lo: “qual é o animal que anda com quatro pernas de manhã, com duas ao meio-dia e com três ao anoitecer?”.

É Édipo que vai derrotá-la; para ele, o enigma se referia às três idades do homem. Borges nos informa que De Quincey propunha outra solução que podia se somar à primeira sem anulá-la: o enigma falaria, na verdade, do próprio Édipo – completamente indefeso na infância, sozinho na juventude e, na velhice, cego, apoiado em seu cajado, ele deveria ter respondido “Sou eu!”. Seja como for, a esfinge pareceu dar-se por satisfeita e mergulhou no penhasco para nunca mais ser vista.

O resto da história é conhecido: aclamado como salvador da cidade, Édipo então casa com a rainha viúva – que é, nada mais, nada menos, que sua própria mãe – e com ela tem quatro filhos. Quando finalmente a terrível verdade vem à tona, a tragédia se precipita: Jocasta, a rainha, se enforca, enquanto Édipo, em desespero, vaza seus olhos com as próprias mãos.

Muriel Rukeyser, poeta e ativista americana, imaginou outra versão para o desfecho: muito tempo depois, Édipo, velho e cego, caminhando pela estrada, reconheceu o cheiro familiar da esfinge. “Tenho uma pergunta a fazer”, disse. “Por que não reconheci minha mãe?”.

“É porque você deu a resposta errada”, respondeu a esfinge. “Mas foi minha resposta que fez tudo acontecer!”, redarguiu o cego. “Não”, disse ela, “Você disse que era o homem – não falou nada sobre a mulher”. “Ora, quando a gente diz homem, a mulher está sempre incluída. Todo mundo sabe disso”, respondeu ele. “Pois isso é o que você pensa”, encerrou ela, com um sorriso de ironia que Édipo não pôde enxergar.


Nota: a esfinge e outros personagens mitológicos serão tema do curso As Criaturas, que ministro na Casa de Ideias a partir desta quinta-feira, dia 13. Informações: (51) 3018-7740 ou contato@ casadeideias.com.

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