segunda-feira, 10 de junho de 2013


10 de junho de 2013 | N° 17458
KLEDIR RAMIL

Vitor Ramil

Vitor Ramil é um sujeito perturbado. Agora mesmo está lançando um disco chamado Foi no Mês que Vem, cá entre nós, um erro grosseiro de concordância. Pensei em ligar pra ele e comentar o tropeço na gramática, mas desisti. Não me daria ouvidos. Vive fora da casinha, em uma cidade hipotética que batizou de Satolep.

Um cara que lê as coisas de trás pra frente e não tem noção de tempo e de espaço não pode ser levado muito a sério. Outro dia, publicou um texto inverossímil onde fazia confidências sobre nossa intimidade familiar. Sim, somos irmãos, o que talvez explique certos distúrbios de comportamento e o traço obsessivo.

Quando nasceu, Vitor foi muito bem recebido pelos irmãos mais velhos, especialmente porque foi contratada uma babá desinibida, que ensinou aos maiores novas práticas de relacionamento humano. Bem interessantes. Portanto, não procede a acusação de que tentamos eliminar o caçula com uma batida de abacate envenenado. Não faz sentido, perderíamos a babá. Seria como matar a galinha dos ovos de ouro.

Na infância, Vitinho aparentava ser uma criança normal até o dia em que, com 12 anos de idade, venceu um concurso de contos que mudou sua vida. O tema era “chocolate” e o prêmio, uma viagem a Ilhéus, Bahia.

Segundo a lenda, esse primeiro contato com o clima tropical da terra de Jorge Amado teria desestabilizado emocionalmente o guri e inspirado o pequeno autor a escrever, anos mais tarde, um ensaio sobre a Estética do Frio. Alguns historiadores preferem a versão de que teria sofrido um choque cultural ao ser agarrado por uma morena cor de jambo, no meio de uma plantação de cacau. Não sei.

Quando jovem, o artista participou de uma expedição a lupanares de Montevidéu, com o objetivo de aprofundar seus estudos de tangos e milongas. Mais do que o lunfardo, a cor acinzentada do cimento penteado da capital uruguaia ficou impregnada para sempre em seu subconsciente e teria contribuído para a melancolia presente na maioria de suas canções.

Apesar dos contratempos, Vitor foi sobrevivendo. Desenvolveu uma capacidade rara de observação e tem produzido obras artísticas de indiscutível beleza. É um sujeito perturbado, no bom sentido: é um artista inquieto.


Elevado pelo frentista de um posto de gasolina de Pelotas à categoria de “o maior cantor da metade sul do Rio Grande”, é o mais bem acabado dos irmãos Ramil. Nós, os que viemos antes dele, fomos apenas experimentos. Dalva e Kleber estavam ensaiando.

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