08
de maio de 2012 | N° 17063
DAVID
COIMBRA
Minhas fotos nu na
internet
Lá estava
eu, aboletadão no sofá do apartamento daquela fotógrafa. Na saída da redação em
que trabalhávamos, ela havia me convidado para acompanhá-la no caminho para sua
casa e, chegando à porta do edifício, ciciou, alongando as vogais:
– Queeer
subiiir?
Uma
agradável surpresa. Até então, ela não parecia estar incluída entre as minhas
possibilidades de romance. Bem, eu não tinha nada para fazer naquela noite
mesmo. Subi. Entrei. Instalei-me no fundo do sofá. Ela deslizou para a cozinha
e voltou de lá com dois copos de cerveja meio gelada. Parecia que tudo ia bem,
que tudo ia dar certo. Aí ela miou:
– Sabe
o que eu queria de tiii? Sorri. Tudo ia bem, sim, senhor.
– O
que você deseja, beibe? – Queria tirar umas fotos tuas... Para um ensaio que
estou fazendo... Descruzei as pernas, minha espinha enrijeceu.
– Fotos?
Que fotos?– É que estou fazendo um ensaio de nus...Pulei para a ponta do sofá.
– N...
nus? Quer dizer... eu... pelado?
– Nu!
Isso! – ela se animou. – Algo artístico, entende? Vai ficar bonito. Se se
deitar ali naquelas almofadas e colocar a perna assim...
Já fui
me levantando. – Tá maluca?
– Não
é nada vulgar. É arte. Juro! Já fui saindo.
– Eu
peladão, imagina...E escapei dali, rapidinho, enquanto ela repetia:
– É arte!
É arte! Arte. Sei.
E
sabendo agora dos casos Dieckmann e Johansson, penso que aquela decisão antiga
foi uma decisão acertada. Vá que minhas fotos vazassem para internet e, hoje,
todos ficassem se repimpando com minha imagem com-ple-ta-men-te pelado...
Você
sabe do que falo quando cito os casos Dieckmann e Johansson: as duas, loiras,
douradas, macias e sinuosas, tiraram fotos delas mesmas valendo-se de pequenas
câmeras.
Fotos
íntimas, clicadas no recôndito do lar, em frente ao espelho do banheiro ou na
solidão do quarto de dormir, em geral com pouca ou nenhuma roupa, fotos muito
simples, mas reveladoras de toda a exuberância da juventude de ambas, porque
ali não há photoshop, nem maquiagem, nem luzes especiais, nem nada. Ali só há pele
e músculos e pelos e mais nada.
Repare
que as duas são atrizes e lindas e famosas. Ou seja: são mulheres fotografadas
de sobejo, inclusive em nus “artísticos”, como aquele ao qual queria me
submeter a minha colega fotógrafa. Por que, então, elas, Dieckmann e Johansson,
se fotografaram?
Resposta:
porque elas queriam se ver. Queriam conferir como realmente são.
As
pessoas têm dificuldades de saber como são, como os outros as veem. E sabem que
o que elas são de fato não é o que aparece em público, não é o que elas
PERMITEM que apareça, porque essa imagem é muito longínqua da real, é uma
imagem adrede preparada.
Não é
também a imagem refletida no espelho, porque essa imagem é próxima demais, é instantânea
demais. O que elas são de fato só pode ser visto em outra imagem, impessoal,
distante, captada por uma foto ou por um filme, que elas analisam depois de
feito, criticamente, como se fossem outra pessoa.
Trata-se
quase de uma contradição: você olha a intimidade com distanciamento crítico, e
assim surge a verdade. Ocorre com outros aspectos da existência. Como você descobre
todas as qualidades e defeitos de um time de futebol? Estando perto desse time,
sendo esse time da sua cidade.
Como
você descobre se esse time é grande ou pequeno? Examinando-o depois que ele se
desmontou e já não existe mais. Isto é: o time, de certa forma, é “seu”, mas
pertence ao passado. Assim, ainda não sabemos a real dimensão do Barcelona de
Messi, porque ele ainda vige. Mas já sabemos quem são de fato Carol Dieckmann e
Scarlett Johansson, o que é muito melhor.
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