O tango de Tibério e Lola
Estavam
dançando um tango: quando ele ia, ela recuava, quando ele recuava, ela vinha
O
amor é um tango. Hoje vou contar uma história de amor que ouvi de alguém esses
dias. Esta história é real e nos faz pensar, afinal, quem somos nós.
Tibério
era um jovem promissor. De boa família e com bons antecedentes, era visto como
alguém inteligente, vivo e alegre. Vivia sua vida, numa casa de classe A,
quando, numa noite de calor, viu alguém chegar à vizinhança. Loira, naquela
idade que as avós chamavam de menina-moça, mesmo que ainda novinha, já se
mostrava pronta para um investimento erótico.
Lola
passeava pela vizinhança, livre e senhora de si, como são as fêmeas da espécie
quando seguras de sua beleza e de seu charme. Para o coração do jovem Tibério,
aquilo foi demais.
Ficou
obcecado por Lola. Tentou voltar para sua vida pré-Lola, mas não adiantou. Nada
do que tinha fazia mais sentido, pensava naquela jovem loira todo o tempo. Ficava
parado olhando para parede, como se sua casa, sua vida e seus objetos de valor
tivessem se esvaziado de sentido. Se Tibério soubesse filosofia, diria que a
vida perdera o significado.
Ele
era ainda virgem. No fundo da alma, se envergonhava disso e preferia que este
fato permanecesse em segredo.
Mas,
de repente, tomou uma decisão e resolveu abordar a bela e irresistível Lola, a
loira arrasadora do "cartier", como dizem os franceses. Quem sabe,
pensou Tibério no silêncio de sua alma, ela fosse, ainda que jovem e virgem,
uma loira devassa em potencial? Pelo caminhar dela, balançando, ainda que
discretamente, as promissoras ancas, ele pensou que tinha alguma chance.
Chegou
perto e tentou falar com ela. Nada. Aquele olhar de desprezo que só fêmeas
lindas da espécie sabem dar quando percebem que algum jovem candidato está por
perto. Mas, percebia Tibério, Lola o olhava pelo canto dos olhos.
Tibério
tinha razão. Ela estava dando sinais de interesse. Aproximou-se e tentou chegar
bem pertinho. Lola, literalmente rosnou para ele. De primeira, Tibério temeu
que ela o fosse morder de fato.
Tibério
correu para casa, temeroso. Mas o desejo era grande, e Lola seguramente o
olhava de longe, com olhos doces. Todos os seus genes ancestrais diziam: "Tibério,
vá fundo, cara!".
O
jovem voltou à carga. Pensou naquilo que todo macho pensa: "Ela quer um
presente!". Não tinha nada à mão e, infelizmente, dependia da sua família
para ir a um shopping, portanto teve uma ideia desesperada: "Vou dar para
ela o que eu mais gosto e assim ela vai ver que eu quero muito ficar com ela".
Correu
e pegou um objeto (pouco importa o que era, mas sim o valor que tinha para ele;
de longe alguém diria que não passava de uma bola). Colocou carinhosamente o
objeto diante da bela Lola. Ela, de novo, desprezou o infeliz Werther. Recuou. De
longe, de novo, percebeu o discreto sorriso da bela Lola. Ela estava mesmo dançando
um tango com ele: quando ele ia, ela recuava, quando ele recuava, ela vinha.
Uma
dor grande se apoderou do pobre coração apaixonado. Mas, de novo, seus genes
clamavam pela jovem Lola. Decidiu fazer-se de macho poderoso do pedaço e se
aproximou confiante.
De
repente, assim como quem ia roubar um beijo e um abraço, Tibério tentou se
apossar de Lola. Ela, agora sem dúvida nenhuma, rosnou e o mordeu sem pena.
Tibério
fugiu humilhado. Perdido, tentou comer alguma coisa. Mas, de novo tomado pelo
amor, pensou se Lola não o aceitaria em troca de sua comida importada, mesmo
que por um segundo tivesse pensado que aquilo não eram modos de abordar uma
dama fina como Lola.
Docemente,
ele empurrou a comida para ela. Lola comeu a comida dele e virou de costas. Tibério
ficou arrasado e sentou-se, triste, enquanto a contemplava pela porta de vidro.
Lola olhou para ele e ensaiou um sorriso, mas não adiantou. Tibério já estava
triste e adormeceu. No dia seguinte, à mesma hora que Lola chegara,
reconhecendo o carro, correu para o porta-malas para ver se a bela Lola voltara.
Mas não.
Alguém
perguntará: como uma bela dama pode vir num porta-malas? Simples: basta ela ser
uma golden retriever, e ele, um border collie.
Sim,
o amor é um tango, seja entre humanos, seja entre cães.
ponde.folha@uol.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário