sábado, 5 de maio de 2012



06 de maio de 2012 | N° 17061
PAULO SANT’ANA

Forçoso é refletir

Todas as pessoas que encontro me dizem que não gostam quando escrevo sobre a morte. Detestam quando escrevo que estou para morrer.

Eu gostaria de responder a essas pessoas com o que disse o imperador Marco Aurélio, da Roma antiga, que era um filósofo: “Não sei por que se teme tanto a morte se ela significa a paz, o descanso definitivo. Além disso, a morte é o único lugar em que todos se tornam iguais”.

Em outras palavras, Marco Aurélio quis dizer que a morte é uma coisa muito boa. A melhor de todas as coisas.

E, sendo assim, é paradoxal que todos não queiram morrer, lutam para não morrer.

Só quem deseja a morte e não a teme são os suicidas.

De alguma forma, Marco Aurélio, ao afirmar que a morte é a única situação em que todos se tornam iguais, quis também afirmar que a única forma de socialismo é a morte, ou seja, ao contrário do princípio constitucional brasileiro “de que todos são iguais perante a lei”, todos são iguais perante a morte, isto sim.

Não existe nada mais falso do que “todos são iguais perante a lei”. Os pobres, os negros, os doentes do SUS, ninguém é igual perante a lei.

E o pior e o mais perverso de tudo é quando as leis tornam os homens desiguais.

O que faz o homem infeliz é exatamente ele acreditar na lei e na Justiça. Isso é o que revolta o homem.

A maior de todas as justiças, portanto, é a morte. Nela, o pobre e o rico se igualam. A mulher e o homem se igualam. Até os animais e os homens se igualam com a morte, tanto que nutro a esperança ardente de me reencontrar no céu com meu adorável cãozinho Dick, morto há tantos anos e por quem tenho uma saudade comovente e perfurante.

A morte, já chegamos a esse acordo por esta reflexão, é justa.

E a vida é profundamente injusta. Vejam o privilégio da herança, que separa os homens em ricos e pobres desde o seu nascimento.

Ou seja, é profundamente injusto que uma pessoa já nasça rica.

E não é injusto que uma pessoa já nasça pobre. Afinal, ela tem a vida inteira pela frente para adquirir seu patrimônio.

Enquanto aquele que já nasceu rico nem precisa esforçar-se para adquirir patrimônio, ele já o possuía desde seu nascimento.

Outro privilégio odioso da vida é que umas pessoas já nasçam bonitas, enquanto outras nascem feias.

Uns já nascem fortes, robustos, outros nascem mirrados ou doentes. Pode existir maior desigualdade decretada exatamente pela vida? É incrível, mas só quem pode corrigir isso é a morte.

Eu confesso que, como todos, não tenho boa ideia sobre a morte. Mas será que não estou enganado?

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