05
de maio de 2012 | N° 17060
NILSON
SOUZA
O prisioneiro do céu
Foi
meu saudoso companheiro de ofício Jose Abraham, o Espanhol, que a esta altura
deve estar fotografando nos céus da Catalunha, que me advertiu com uma expressão
usual na sua terra natal: “Barcelona es bona si la bolsa sona”. Em seguida,
arrematou, sorridente e orgulhoso: “Pero si la bolsa sona o no sona, Barcelona
es bona”.
Na
ocasião, me preparava para uma viagem de trabalho à Espanha, com passagem pela
capital catalã. Mesmo com os bolsos vazios, amei a cidade. Estava lá para
trabalhar, mas conheci alguns pontos turísticos como a catedral da Sagrada Família,
as ramblas e o monumento de Cristóvão Colombo apontando para as Américas, e
fiquei fascinado com as suas livrarias.
Esta
semana, tive a oportunidade de conhecer uma Barcelona que não conheci no
passeio, lendo um dos romances de Carlos Ruiz Zafón, fenômeno da moderna
literatura espanhola. Ele inventou um ciclo de novelas denominado O Cemitério
dos Livros Esquecidos, com personagens que transitam de um livro para o outro. Devorei
El Prisionero del Cielo (não sei se já está traduzido para o português),
presente de uma amiga recém-chegada da Europa.
Lembro
de ter visto de longe o Castelo de Montjuic, no alto de uma montanha que faz
sombra à cidade. Pois é no interior da fortaleza, transformada em prisão em vários
momentos históricos da vida do país, especialmente durante a ditadura de
Francisco Franco, que se passa boa parte da história protagonizada por Fermín
Romero de Torres, um dos principais personagens da série.
O
texto de Zafón é envolvente e divertido. Pega o leitor pela curiosidade e não
larga mais, até porque ele usa a técnica de terminar os capítulos com enigmas e
mistérios que serão resolvidos logo adiante. Quem resiste? Em dois dias,
derrubei as 270 páginas e fiquei ansioso para pegar os outros livros da
tetralogia.
Gaúchos
que vão a Barcelona para estudar ou trabalhar costumam dizer que a Catalunha é o
Rio Grande do Sul que deu certo. Nem tanto, se considerarmos o atual momento de
crise econômica da Espanha ou se voltarmos às guerras sangrentas pelas quais
passaram os espanhóis. Mas a região é autônoma e muitos catalães cultuam o
sentimento separatista, sob o conhecido slogan: “Cataluña no es España”.
Nem
no idioma. Franco, aliás, proibiu o catalão, assim como outras línguas
regionais da Espanha. Mas a voz do povo sobrevive aos ditadores. Tão logo
passou a ditadura, o catalão voltou forte e se mantém como idioma oficial.
Jose
Abraham lutou ao lado dos republicanos, também foi preso e perseguido pelo
franquismo, antes de vir para esta Catalunha brasileira, que é o nosso Rio
Grande. Era um grande fotógrafo e um sujeito extremamente alegre e divertido. Ao
ler o livro, me dei conta de que conheci na vida real um legítimo personagem
dos romances de Zafón.
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