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terça-feira, 24 de junho de 2008
JANIO DE FREITAS
Caminhos da Providência
Até agora, o relato das vítimas da soldadesca não resultou em novidade útil; a discussão sobre o Exército também não
ENQUANTO SE aguarda a investigação que levante a correta narrativa da prisão em quartel do Exército, tortura e morte dos três rapazes da Providência, o assunto deriva em dois rumos.
Aos poucos, moradores daquele morro, inclusive não favelados, abrem-se a respeito de violências anteriores dos soldados do Exército, só por arbitrariedade e covardia, como se fossem inúmeros preparativos para o desfecho com os crimes de morte.
De outra parte, o seguimento já tradicional de cada episódio mais chocante na criminalidade urbana: a discussão sobre a entrada do Exército, ou não, na busca da segurança pública. Até agora, os relatos das vítimas da soldadesca não resultaram em novidade útil.
A discussão sobre o Exército também não. Se o problema das vítimas não justifica otimismo, como demonstra a paralisia da queixa policial de um advogado agredido na Providência, o da participação do Exército nem tem cabimento.
É impossível saber se efetivos militares têm o que fazer na contenção da criminalidade porque não existe plano algum de ação decisiva contra o predomínio da bandidagem.
Até hoje, simplesmente a polícia entra na favela atrás de bandidos, policiais e seus alvos matam-se uns aos outros, de um lado e de outro famílias ficam ao desamparo, a elas juntam-se as mães e os filhos alcançados por tiros errados -e só. Até que chegue o dia seguinte, igualzinho, em outra favela.
Foi nesse jogo sem vitórias que o Exército entrou, em passado momento agudo da insegurança pública no Rio. Os coronéis dos seus tantos estados-maiores, especialistas no planejamento de guerras hipotéticas, só bolaram contra as tropas bandidas a novidade de apontar tanques e canhões para as favelas.
Quando seus soldados desceram o morro, lá deixaram histórias iguais ou piores que as de violência policial contra famílias inocentes.
Dessa expedição desastrosa vem agora uma idéia tipicamente brasileira. Repete-a, nas últimas semanas, o seu formulador, Nelson Jobim, ministro da Defesa: "É claro que as Forças Armadas têm obrigações com a segurança.
Mas para isso é preciso mudar a lei. Da última vez que o Exército participou, ainda estão aí centenas de processos. É preciso prevenir isso. Até julho teremos o assunto estudado e uma nova lei até o fim do ano".
A idéia se traduz por mais um anteparo para ações ilegais, em especial a violência, nas participações de militares. "Centenas de processos" - por que não?
Se houver motivos, e no caso citado houve até o de saque, justificam-se; se não, o Judiciário os extingue. A lei jobiniana não será ou seria lei, é intenção de privilégio.
Com fundamento neste conceito que Nelson Jobim ofereceu como lição ao país, em entrevista quarta-feira na GloboNews: nossa conduta não tem que se orientar por princípios e convicções, mas pelo pragmatismo. O autor não suscita dúvida a respeito.
Até que surja, se surgir, um planejamento competente e exeqüível para substituir as rápidas investidas policiais que apenas substituem bandidos mortos por novos bandidos, lançar nas favelas os recrutas que vão passar meia dúzia de meses no Exército é, no mínimo, irresponsabilidade.
Cujas conseqüências jamais recaem onde deveriam. Porque a praxe assegura soluções que tornaram dispensável a lei jobiniana. E o caso da Providência, até agora, mostra que continuam a dispensar.
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