terça-feira, 24 de junho de 2008



24 de junho de 2008
N° 15642 - Paulo Sant'ana


Um fato, duas opiniões

Como falei esses dias, é muito difícil interpretar esse fenômeno chamado opinião pública.

Em princípio, opinião burra é a opinião que manda contra a nossa.

Quase sempre existe um fato e duas opiniões sobre ele. Uma é a favor; outra, contra.

Vejam o caso da escritora Cíntia Moscovich, de quem publiquei e-mail reclamando de uma creche do Grêmio Náutico União, no Moinhos de Vento.

Entre várias colocações contra a creche, a escritora se referiu à algazarra que as crianças e os professores da creche fazem diariamente, "não consigo mais trabalhar e meus bichos (cachorros) se tornaram inapetentes e inquietos, os pobrezinhos".

Foi a conta, choveram sobre a minha mesa e-mails protestativos, um deles o mais contundente: "Não acreditei no que li. Essa senhora Moscovich provavelmente nunca teve filhos, pois sua indignação com o barulho das crianças é demais. E mais descabido é dizer que os POBREZINHOS DOS CACHORROS estão sofrendo com algazarra feita por crianças saudáveis.

O que é isto? Em que mundo estamos? Que frieza é essa? Reclamações em detrimento das crianças e a favor dos bichos? Que tal se no lugar das crianças tivesse uma criação de cachorros e gatos, de preferência bem fedidos e latindo noite e dia?

Com certeza essa senhora iria adorar, pois estaria de acordo com ela. E eu, graças a Deus, bem longe dela, aqui no Menino Deus. Um grande abraço da leitora (ass.) Cleide Maria Martins (cleidemm@terra.com.br)".

E o médico Renan Rangel Bonamigo (rrbonamigo@gmail.com): "A escola do Grêmio Náutico União está localizada em um dos bairros onde, pasme-se, há outras escolas infantis. Incrível, mas há creches e escolas desse tipo espalhadas por toda a cidade.

E quem são seus vizinhos? Outras casas residenciais, edifícios, lojas, parques, igrejas, estádios de futebol, enfim. Parece que estão definitivamente integradas ao meio urbano. E agora?

Quem sabe, proponha-se o deslocamento dessas escolas para guetos específicos, nos quais os sons das crianças (choros, risadas, gritos de espanto e alegria, canções, essas anormalidades infantis) não atrapalhem os adultos mais sensíveis e o apetite de seus animais domésticos. Ora, convenhamos...".

E assim se vai, um fato só e duas opiniões. A mesma coisa com a lei de "tolerância zero" para o álcool no trânsito.

Por igual choveram e-mails sobre a minha mesa protestando contra o rigor da lei. Pessoas que não se conformam que não possam mais ir a um restaurante ou churrascaria, a uma festa, aniversário, casamento, com receio de serem pilhadas com uma quantidade mínima de álcool no sangue.

Converso com trabalhadores, profissionais liberais, autônomos, empresários que alegam nunca ter cometido infrações no trânsito e agora são atingidos pela lei, que modifica inteiramente seus hábitos de beber uma cervejinha ou vinho em restaurantes, nos fins de semana, ficando agora impedidos desse prazer honesto.

Todos têm a mesma opinião: é rigorosa demais a lei. Mas há muita gente a favor da lei. Quase sempre são os que não bebem socialmente.

Mas saúdam a lei porque querem evitar mortes no trânsito. Ou seja, como muitas vezes acontece no estamento legal, os justos pagam pelos pecadores.

No entanto, se diminuírem a partir de agora as mortes no trânsito, terá a lei a sua justificativa existencial aprovada.

Afinal, ninguém ficou proibido de beber nos bares, restaurantes, churrascarias, festas em geral.

O que foi proibido é que bebam socialmente e depois voltem para casa dirigindo.

Vai valer a pena que se crie o hábito de quando for beber fora de casa se faça acompanhar de alguém que não beba álcool para dirigir na volta.

Um fato e duas opiniões, mais uma vez. E quem bebe pouco na rua está furioso, pelas mensagens que me chegam.

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