sábado, 28 de junho de 2008



29 de junho de 2008
N° 15647 - Martha Medeiros


Compro, logo existo

Uma amiga acabou de chegar de Londres. Adorou, lógico. Mas ela disse que os preços estão um escândalo, uma exorbitância. Pensei: então é pra lá que eu vou.

Explico: eu também cheguei de viagem, estive em Buenos Aires, e os preços por lá estão igualmente um escândalo... de tão baixos! Algum problema nisso? Sim, há um problema nisso.

Óbvio que é sensacional ter transporte público barato (uma viagem de metrô está por cerca de R$ 0,60 e qualquer corrida de táxi dentro dos bairros mais procurados não custa mais do que R$ 5).

Nada como tomar um bom vinho sem ter vontade de chorar quando chega a conta, e comprar um casaco pra vida toda pagando três vezes menos o valor que pagaríamos aqui.

O problema? Já digo.

Quem gosta de viajar, mas gosta mesmo, aproveita seu tempo para caminhar pela cidade, apreciar prédios históricos, conhecer parques, entrar em livrarias, visitar museus e galerias de arte, vasculhar lojas de discos atrás de alguma novidade, jantar bem, ir a espetáculos e tomar um café com calma em algum lugar charmoso enquanto observa os transeuntes. Claro, fazer umas comprinhas também está no roteiro.

O problema, enfim: numa cidade com preços atraentes como Buenos Aires todo o resto (museus, shows, parques, cafés) fica para quando sobrar tempo - no caso de. O objetivo passa a ser comprar. Ir a todos os shoppings. Gastar até o último centavo, trazer tudo o que puder, abandonar-se à compulsão.

Eu, que estou longe de ser uma consumista crônica e me orgulho do meu comedimento, também fiquei impressionada com os preços argentinos. Uma pessoa controlada faz o quê?

Aproveita uma tarde para comprar o que precisa e segue seus dias curtindo o que a cidade tem a oferecer em termos culturais, ambientais, artísticos.

A questão é saber diferenciar o que se precisa e o que não se precisa, e se formos honestos, chegaremos à conclusão de que não precisamos nem da metade do que consumimos.

Eu gosto de bugigangas, e minhas compras em viagem quase sempre se restringem a artigos de papelaria, acessórios (pulseiras, echarpes) e algum artesanato, são os meus suvenires habituais, coisinhas coloridas e inventivas que me fazem lembrar da viagem pra sempre.

Mas se você entra em surto por causa de preço bom, vai encher três malas extras de coisas volumosas que, tudo bem, são baratas, mas que também são encontradas em Porto Alegre, e em Porto Alegre você nem olharia para elas, não importa quanto custassem.

Teve um momento em que me vi dentro de uma loja revirando cabides e me deu um estalo: o que estou fazendo aqui? Que ânsia é essa de "aproveitar" os preços?

Tenho que aproveitar a cidade, o meu tempo livre, a minha companhia, o meu olhar estrangeiro, a minha sede de informação, a minha curiosidade, e não me sobrecarregar de sacolas. É preciso estabelecer uma fronteira entre se apaixonar de verdade por um artigo e se apaixonar por comprar, simplesmente.

Da próxima vez, Londres. É perfeito. Olha-se algumas vitrinas, suspira-se e toca-se em frente até um dos arrebatadores parques da cidade para fazer um belo e barato piquenique.

Consumo consciente: Rui Spohr, preocupado em viabilizar projetos de inclusão social, colocou à venda uma camiseta confeccionada por ele onde se lê a frase: "A sofisticada originalidade do simples".

Quem comprar a camiseta, estará contribuindo para a Instituição Kinder, que presta atendimento educacional a crianças e adolescentes com deficiências múltiplas. Maiores informações no site http://estilistaruispohr.blogspot.com

Excelente domingo, um ótimo início de semana e um Feliz mês de julho.

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