quinta-feira, 26 de junho de 2008


ELIANE CANTANHÊDE

Ruth Cardoso

BRASÍLIA - Há alguns anos, ainda no primeiro mandato de FHC, o então ministro José Serra me descreveu a antropóloga Ruth Cardoso como "uma mulher admirável, com uma inteligência superior".

Poder-se-ia descontar a antiga amizade de Serra com o casal Cardoso, consolidada nos anos de exílio no Chile, não fossem os elogios a Ruth uma constante entre todos os que conviviam com mais ou com menos intensidade com ela.

Com sua morte, personagens como Pedro Malan, Paulo Renato e Clóvis Carvalho desfilaram adjetivos para enaltecer a mulher inteligente, culta e discreta.

Mas não foi a oportunidade, foi o que eles disseram sempre, na Presidência de FHC e depois. Com a concordância de muita gente, do DEM ao PT.

Ruth Cardoso detestava o título de primeira-dama e não gostava de jornalistas. Nos oito anos de mandato, eu poderia contar nos dedos as vezes em que a vi pessoalmente, e só falei com ela, diretamente, uma vez -sobre questões de gênero.

Ao entrevistar FHC no antigo apartamento dele da rua Maranhão, encontrei um ambiente acolhedor, sóbrio, com cadeiras confortáveis e objetos colhidos de viagens a diferentes regiões do mundo.

Um típico apartamento de professores universitários com boa vivência no exterior, sem luxos desnecessários, sem traços de novo-riquismo. Ruth não estava, mas a casa era a cara dela.

Com a elegância que só as pessoas discretas têm, Ruth Cardoso também era profundamente orgulhosa da sua independência, sobretudo intelectual, de um marido tão esfuziante e com tanto poder.

Jamais se ouviu dizer de sua interferência num programa de governo, numa decisão do Planalto, num movimento político do presidente.

O poder corrompe e deforma, mas Ruth Cardoso entrou e saiu dele com a mesma cara, o mesmo trajar, a mesma discrição e o mesmo respeito por ela própria. Como disse Serra, uma mulher admirável.

elianec@uol.com.br

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