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sábado, 14 de junho de 2008
14 de junho de 2008
N° 15632 - Nilson Souza
Alienígenas
O primeiro frio de junho me fez espirrar, e me lembrei imediatamente daqueles índios isolados que apontavam suas flechas para o avião da Funai, nas imagens divulgadas ao mundo no mês passado.
Eram dois homens inteiramente pintados de vermelho e uma mulher coberta de tinta preta, eles aparentemente preparados para se defender da invasão alienígena e ela aparentemente apenas curiosa, pois não portava arma nem parecia tão assustada com a visão da máquina voadora.
Por que me lembrei deles? Ora, porque os especialistas vivem dizendo que um simples resfriado desses que nos atingem a cada inverno seria suficiente para dizimar tribos inteiras que nunca tiveram contato com as doenças do homem branco.
De minha parte, os irmãos selvagens podem ficar tranqüilos: não tenho a mínima vontade de pisar naquele fim de mundo cercado de verde, num ponto qualquer entre o Acre e o Peru.
Mas aquela imagem mexeu comigo. Não pude deixar de pensar que o avião dos pesquisadores deve ter assustado mais aquelas criaturas do que as caravelas européias no século 16. Com uma diferença abissal: os portugueses e os espanhóis não vieram para tirar fotografias dos nossos bisavós nativos.
Vieram para levar suas riquezas, para tomar-lhes as terras, para corromper suas vidas e para inocular a culpa e o pecado em suas almas ingênuas.
Agora, também aparentemente, somos alienígenas menos gananciosos. Por enquanto, num primeiro sobrevôo, nos contentamos com essas imagens digitais que capturam aquele mundo estranho no interior da Floresta Amazônica e o transportam quase que instantaneamente para a primeira página dos nossos jornais.
A cena causa duplo espanto: eles, com os corações aos pulos e o arco retesado, apontando flechas do passado para os nossos olhos; e nós, perplexos com a descoberta ancestral e com a existência de vida inteligente sem telefone celular, computador e televisão, mas acreditando que podemos vencer aquelas armas precárias com um simples espirro.
Alienígena é sempre o outro. E no entanto somos tão iguais nos nossos sentimentos, nos nossos assombros e nos nossos temores.
Aposto como no cair da noite, depois de tirar o medo da cabeça e o urucum do corpo, um daqueles grandalhões imberbes deve ter comentado baixinho para os companheiros de refeição, lá na língua deles, o mesmo que todos dissemos quando vimos as fotografias: - Que coisa!
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