06
de junho de 2013 | N° 17454
L. F. VERISSIMO | L.F. VERISSIMO
Ting-ling
Nas
casas senhoriais do Japão antigo, era comum colocarem sininhos sob o assoalho
dos corredores. Era impossível pisar numa tábua do chão de um corredor sem que
soassem os sininhos. Conhecendo-se a violenta história do Japão medieval, com
facções em luta constante pelo poder, é fácil deduzir que os sininhos existiam
para denunciar a aproximação de espiões ou assassinos.
Mas
o ting-ling também devia servir como alarme contra ladrões e para prevenir o
flagrante de adultério. Imagine-se a senhora da casa prestes a arrancar as calças
do entregador de pizzas, ou o equivalente na época, quando este levanta a cabeça
e pergunta:
– Esse
som de sininhos é do templo? – Não, é o meu marido!
O
ting-ling era uma maneira prática de evitar surpresas. Mas pode-se imaginar o
grau de desconfiança de uma sociedade em permanente pavor do que vem pelo
corredor. Até que se revelasse quem ou o que vinha, os sininhos poderiam
significar qualquer coisa, alimentar qualquer paranoia.
E
qualquer tilintar poderia ser confundido com o ting-ling. Um gorjeio de
passarinho, um pingo de chuva no teto, um brinde com cristais, até os inocentes
sininhos do templo. E um gato solto num corredor espalharia o terror pela casa
toda.
No
Brasil de hoje, desenvolvemos uma paranoia parecida. De tanto ouvir falar em
roubalheira e maracutaias, nos acostumamos a equacionar política e corrupção. Tudo
o que vem pelo corredor é suspeito, todo ting-ling é um prenúncio de escândalo.
E,
como no Japão antigo, também vivemos em permanente estado de desconfiança. Claro
que a classe política é responsável pela sua própria má reputação, mas há exceções
importantes. E hoje não se rouba mais do que antes – é que antes não se ficava
sabendo a metade.
Enfim:
nem tudo que tilinta é má notícia.
Motivo
Da série
“Poesia
numa hora dessas?!”
Ele
em Porto Alegre
onde
o aeroporto
vira
e mexe
fecha.
Ela
em São Paulo
onde
tem nevoeiro
de
janeiro a janeiro.
Resultado:
o amor acabou.
Por
nenhum motivo concreto
– por
falta de teto.
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