sábado, 5 de maio de 2012



05 de maio de 2012 | N° 17060
PAULO SANT’ANA

Vingança

Assisti a uma cena na rua anteontem que me deixou pensativo: um homem esbofeteou o rosto de outro. E o agredido não reagiu: subiu no seu carro e disse somente ao agressor: “Isso não vai ficar assim, a tua hora vai chegar”.

Ou seja, o agressor anunciou uma vingança.

Um dos mais espontâneos impulsos do comportamento humano é o da vingança. Não sei por que, mas o homem sente necessidade de punir quem o maltratou ou desfavoreceu.

Digo que não entendo bem isso porque o contrário da vingança é o perdão. E a natureza humana não é muito afeita ao perdão.

A própria Bíblia é muito contraditória a respeito. De um lado, ela descreve Deus como misericordioso, isto é, como mobilizado para perdoar.

Mas, de outro lado, os ensinamentos bíblicos afirmam que conhecerá o fogo do inferno aquele que praticar o mal.

Ou seja, a Bíblia se mostra piedosa, indulgente com os pecadores, mas também os ameaça do maior castigo que pode existir, que é viver para a eternidade no inferno.

A criatura humana não é muito inclinada ao perdão. Pelo contrário, se inclina para a punição.

Não tem outro objetivo o Código Penal que não seja advertir os homens de que, se eles errarem, vai cair sobre si uma pena, um castigo.

Esse próprio Código Penal não dá muito lugar ao juiz que julga os crimes para que perdoe os réus. Sob certo aspecto, os juízes são obrigados a punir os que delínquem. Logo, a natureza humana é muito mais punitiva do que misericordiosa.

Eu e todas as crianças do mundo, desde que engatinhamos, aprendemos com nossos pais que se cometermos alguma travessura seremos punidos, desde as palmadas até outros castigos bem coercitivos.

Isto é, desde nossa infância nos deixam claro que pagaremos caro pelos nossos erros.

Essa reprimenda não tem outro nome que não seja vingança. O Estado, quando julga alguém nos seus tribunais, está à procura de vingança. Ou seja, de castigo para quem errou.

A pena que se impõe aos condenados deve ter, segundo os penalistas, um caráter regenerativo, de conversão do criminoso, um caráter educativo, mas, em última análise, a pena tem o caráter retributivo da vingança.

Lupicinio Rodrigues, no samba-canção Vingança, que foi gravado em várias línguas, até japonês, terminou assim a sua obra-prima: “Mas enquanto houver força em meu peito/ eu não quero mais nada/ só vingança, vingança/ vingança aos santos clamar./ Você há de rolar como as pedras que rolam na estrada/ sem ter nunca um cantinho de seu pra poder descansar”.

Ou seja, até o grande e sentimental poeta era severo no seu objetivo de vingança. Quis castigar a mulher que o traiu ou o abandonou com o degredo aqui na Terra.

E o pior de tudo é que o ingrediente motor da vingança é o ódio.

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