domingo, 8 de novembro de 2009


CLÓVIS ROSSI

O câmbio, o peixe e o gato

SAINT ANDREWS (Escócia) - Governos, quaisquer que sejam, têm uma quase invencível resistência a admitir dificuldades ou problemas. O governo Lula levou essa tendência ao paroxismo, até pelo estilo "nunca antes" do presidente.

Por isso, é louvável que o ministro Guido Mantega reconheça, agora, que a valorização do real é excessiva e pode, se mantida por um período mais ou menos longo, "acabar com a indústria brasileira".

Pior: o dólar está muito desvalorizado também em rela ção às demais moedas relevantes, com exceção do yuan chinês, praticamente indexado a ele. Há, portanto, o risco de se criar uma nova bolha, quando o mundo mal está se recuperando do estouro da bolha anterior.

Mantega, que conversa regularmente com Nouriel Roubini, o economista tornado icônico por ter sido um dos raríssimos que previu a crise, deve ter ouvido dele a apocalíptica previsão de que se está formando uma "bolha monstro" como decorrência do mecanismo chamado "carry trade".

Funciona assim: investidores tomam empréstimos em dólares, a juros de avô para neto, e compram ativos por exemplo em países que têm juros mais altos e nos quais o dólar também está baratinho, baratinho (o Brasil se enquadra em ambos os casos).

É um dos desequilíbrios da economia mundial que deveria estar na agenda da reunião ministerial do G20, que terminou ontem aqui na Escócia. Por força das imposições industriais, sou obrigado a escrever este texto antes de conhecer as decisões do encontro, mas as informações disponíveis indicam com certa segurança que a discussão não avançou o suficiente. Os ministros voltarão ao assunto no início de 2010.

Até lá, o governo brasileiro será obrigado a manter um olho no peixe da euforia e outro no gato do câmbio, que pode comê-la em algum ponto futuro.

crossi@uol.com.br

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