terça-feira, 17 de novembro de 2009



17 de novembro de 2009 | N° 16158
LIBERATO VIEIRA DA CUNHA


Montevidéu na primavera

Algumas pessoas viajam para a Tasmânia, outras para Pago-Pago. Eu escolhi agora como destino, para uma breve temporada, Montevidéu, Uruguai. Fiz isso por pura saudade de um tempo que se foi. Minha primeira viagem fora das fronteiras de Porto Alegre e de Cachoeira, isto quando eu tinha 18 anos, foi a amável república que nos dá a honra de sua vizinhança. Quer dizer: meu combustível era a saudade.

Me aguardava em Carrasco um novíssimo aeroporto, que lembra Renzo Piano e outros grandes mestres da arquitetura. Mais do que ele, me esperava uma sedutora recepcionista: a primavera luminosa que me fez graciosa companhia durante todos os dias que passei na oriental, democrática república.

Embora conheça Montevidéu há tanto tempo, refiz percursos ao modo de quem recém lhes fosse apresentado. Cheguei a me inscrever em city tours que me levaram da renovada Ciudad Vieja a Playa Ramirez, Punta Carretas, Pocitos, Malvin e a uma infinidade de outros bairros em que nada havia mudado para tudo mudar. Eu sou o primeiro no entanto a reconhecer que havia um sentido de permanência no ar. Há detalhes da arquitetura de uma capital que no Brasil mudam a cada instante. Na do Uruguai, no entanto, resta uma atmosfera de completude que talvez nunca se altere.

Falo da arquitetura humana. As pessoas são amáveis. As fórmulas de cortesia são universais. Nada me tocou mais do que tornar a ouvir, depois de agradecer por qualquer favor, uma brevíssima sentença: Usted merece. São fórmulas que fazem parte natural da conversação, como quem diz bom dia ou por favor. A cidade em si praticamente é a mesma que conheci no distante ano da graça de 1963. Há, é claro, o novo palácio presidencial, uma escultura em aço e vidro, em azul e esmeralda, que encanta por suas linhas sóbrias e belas. Há também a torre das telecomunicações, mas esta é mais antiga. Restam intocadas as ruas margeadas de plátanos, as casas de um traço clássico, monumentos como o Palácio Salvo, os cenários da Rambla Costanera.

E sobrevivem, aparentemente muito bem da saúde, os cassinos, aí incluído um novo, Las Maroñas, em plena Avenida 18 de Julio. Foi instalado em um palácio restaurado em todo o esplendor, mas guarda para mim um pecado capital: as apostas não se fazem com o prestimoso auxílio do crupiê, mas com os bons ofícios de mecanismos eletrônicos.

Nada disso no entanto rouba o charme de Montevidéu. Este vai desde as crianças em seus uniformes escolares ao sóbrio desenho das mansões ancestrais.

Sem falar, é claro, na senhorita que nunca viste e de repente te lança todo um olhar de fascínio e de mistério.

Uma linda terça-feira, com muito sol lá fora e ai dentro de ti.

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