sábado, 28 de novembro de 2009



28 de novembro de 2009 | N° 16169
NILSON SOUZA


Pássaros virtuais

Li outro dia a carta de um leitor indignado com o canto dos sabiás, que andam excitadíssimos nesta época do ano e não o deixam mais dormir aquele sono bom da manhã. Os bichinhos começam cedo mesmo a sua sinfonia: lá pelas bandas da Zona Sul desta capital arborizada onde moro, eles abrem o bico por volta das quatro da matina e não fecham mais.

Às vezes acordo, outras vezes já estou acordado, mas na maioria das vezes incorporo a cantoria em algum sonho retardatário e nem me dou conta de que a passarada madrugou. Nunca me incomodam.

Tem até um casal que se instalou no meu jardim. Nunca sei qual é o macho e qual é a fêmea, pois se vestem com as mesmas penugens, mas suponho que a senhora Sabiá seja a que passa a maior parte do tempo no ninho, estrategicamente construído nos galhos internos de um pingo-de-ouro.

Fica bem em frente à janela do meu escritório. Quando trabalho em casa pela manhã, procuro abri-la bem devagar para não assustar os hóspedes. Pelo que li a respeito deles, a estada será curta. Logo os filhotes estarão alçando voo para cantar em outra freguesia.

Enquanto isso não ocorrer, porém, podem ficar por lá o tempo que bem lhes aprouver. Não vou espantá-los, mesmo correndo o risco de ser denunciado por infrigir a Lei do Silêncio que vigora nesta cidade desde 1983 e que prevê em seu artigo 8º: “É proibido possuir ou alojar animais que frequente ou continuamente emitam sons que causem distúrbio sonoro”.

Por uma dessas coincidências do destino, o homem que assinou esse decreto, então no exercício do cargo de prefeito municipal, me mandou esta semana uma mensagem com pássaros virtuais.

Trata-se de um desses engenhosos programas de computador em que basta clicar na imagem de um dos pássaros retratados para se ouvir o seu canto. São bonitos, mas não se comparam à bela ladainha dos nossos sabiás, que, aliás, não estão contemplados no referido catálogo ornitológico.

Brinquei um pouco com os efeitos sonoros das aves de fantasia, mas logo me cansei. Prefiro ouvir o cântico espontâneo dos pássaros madrugadores do meu jardim. Seus gorjeios de amor e fome invariavelmente se transformam nas vozes dos personagens dos meus últimos sonhos e me ajudam a lembrá-los quando já estou desperto.

Tomara que o missivista mal-humorado não me leia.

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