sábado, 28 de novembro de 2009



29 de novembro de 2009 | N° 16170
MARTHA MEDEIROS


Só estou dando uma olhadinha

"Posso ajudá-la em alguma coisa?” A vendedora faz seu contato educadamente, e eu já tenho a resposta na ponta da língua: “Obrigada, só estou dando uma olhadinha”. Assim deixo claro que não sei se quero comprar algo, ainda não me decidi, vai depender do preço e da gamação que alguma peça me provocar, e enquanto eu não me decido, prefiro ficar sozinha, sem ninguém atrás de mim dando explicações.

A vendedora compreende e me deixa dar quantas olhadinhas eu quiser. Se eu perguntar o preço de algo, ela me responderá e seguirá a alguns metros de distância, de forma discreta. Eu então poderei chamá-la se resolver efetivar a compra ou sair sem levar nada, e nenhuma gota de sangue será derramada. É uma relação cortês e normal.

Só que o normal diverge, dependendo do país e de seus costumes.

Eu já havia estado em Istambul há uns oito anos, e portanto sabia onde estava me metendo quando fui ao Marrocos, mas não poderia deixar de percorrer as ruas da medina de Marrakesh. Como não se infiltrar em meio a lojinhas multicoloridas que vendem castiçais, tapetes, porcelanas, garrafinhas, caixinhas, panos e incensos? Você não vai pra Marrakesh para fazer compras na Zara.

Se você está de passagem marcada para algum país de cultura árabe e pretende trazer lembrancinhas, prepare-se. Os comerciantes partem pra cima dos turistas feito gaviões. Se você tem cabelos loiros e olhos claros, estará ferrado. Se tiver o mesmo aspecto muçulmano que tenho, estará ferrado igual: basta que leve uma mochila nas costas. Eu levava.

Eles vão seguir você pela rua. Perguntar de onde você é. Mesmo que você responda que é de Júpiter, eles vão encontrar algum assunto relativo ao seu lugar de origem, vão ser simpáticos ao extremo e tentarão arrastá-lo até a loja deles.

Estando lá, basta que você olhe com um leve ar de cobiça para o que estiver exposto e, pronto, danou-se. Você vai perguntar o preço e, sem saber, terá dado o pontapé inicial para o hábito que mais dá prazer aos residentes do país: pechinchar.

Pechinchar pode ser lucrativo e pode ser estafante. É lucrativo quando você sabe que o vendedor está pedindo demais e ele sabe que você está oferecendo de menos, e conseguem (depois de 20 minutos de prosa) chegar num valor de bom tamanho para ambas as partes.

E é estafante quando você está apenas dando uma olhadinha, sem tempo para trelelé, e o vendedor está desesperado para vender. Aí, escolham as armas.

Eu não tenho a menor paciência para esse jogo de cartas marcadas, em que um pede um valor absurdo, o outro oferece um valor humilhante, até atingir um empate conciliatório. Prefiro a paz de um preço fixo.

Fazer compras em terra de mercadores me deixou tão pirada que teve um dia em que um cara me disse que não me venderia um castiçal por menos de 80 dirham, que é a moeda local. Entrei no jogo: “O quê? 80 dirham? De jeito nenhum, só pago 100!”.

O Natal está aí de novo e já está todo mundo dando uma olhadinha, afinal, é uma data religiosa: a religião do consumismo.

Menos mal que aqui os vendedores não lhe seguem pelos corredores do shopping nem cultuam o teatro da pechincha, mas, ainda assim, cuide-se: ninguém está livre de pirar.

Um lindo domingo para você.

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