segunda-feira, 23 de novembro de 2009



23 de novembro de 2009 | N° 16164
LUIZ ANTONIO DE ASSIS BRASIL


Vulgaridades

O que é banal, o que é sórdido ou obsceno; o que é rasteiro, o que constrange pela falta de gosto: eis os itens que compõem o gabinete das curiosidades de nosso tempo.

A julgar pelo som dos carros ou pelas fotos das capas das revistas, as pessoas não têm o menor pudor em declarar sua própria vulgaridade.

De um tempo para cá, as comemorações, mesmo as domésticas e outrora íntimas, tornaram-se espetáculos de mau gosto.

Veja-se, por exemplo, o casamento, que, de uma instituição religiosa, legal ou moral, acaba sendo motivo de manifestações da mais deslavada ostentação: em geral ao ar livre [para invocar os “elementais da natureza”(, seja isso o que for)]; em geral com um amigo servindo de oficiante “ad hoc”, gaguejando aforismos de Buda ou de Paulo Coelho; em geral com dezenas de padrinhos, para amealhar presentes; em geral apresentando, no que toca ao figurino dos convidados, uma verdadeira catástrofe.

Quanto às formaturas: promoters tomaram conta de suas encenações, [porque em encenações se transformaram] quase sempre sem o menor conhecimento do que estão falando. Foi possível escutar de um destes, ao se dirigir a seus clientes [porque em clientes se transformaram]: “Na hora em que o diretor põe aquele chapéu na cabeça de vocês, vocês ...”. Chapéu. Sim: chapéu.

No que se refere às leituras que andam por aí, o quadro é assustador. A lista dos best-sellers é vergonhosa. Salvo as clássicas exceções, avultam os livros de interesse prático ou que apresentem soluções milagrosas para a gestão de empresas ou para amestrar papagaios. Mas se falarem sobre cachorros sentimentais, melhor ainda.

A vulgaridade, em si, não é um mal - cada qual tem a biblioteca que merece - mas é sintoma da incapacidade de abstração e de reflexão. O lazer, que poderia representar um tempo dedicado a pensar na vida, é logo preenchido por intoxicantes entregas às compras ou ao entretenimento mais discutível.

Esse quadro não surgiu do nada.

As causas são muitas, mas é inegável que destacam-se, como dominantes, a ausência de uma convicção ideológica ou de uma fé em algo transcendente.

Ou as duas ao mesmo tempo. Mas aí já estamos operando num plano de difícil solução, a não ser que intervenha a passagem do tempo. Espera-se muito do tempo. A Humanidade aprendeu a confiar nele. Mas que não demore.

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