sexta-feira, 13 de novembro de 2009



13 de novembro de 2009 | N° 16154
PAULO SANT’ANA


O tonto

Deus, sejas tu para nós crentes, seja a Providência ou o acaso para os incréus, não permitas Deus que eu seja dominado assim e quase vencido por essa infame tontura que não me permite há 45 dias que eu volte para o Sala de Redação e para o Jornal do Almoço.

E só Deus sabe o quanto tenho saudade do Jornal do Almoço e do Sala de Redação.

Mas, voltando ao meu rogo a Deus, peço-lhe que afaste essa tontura que me faz cambalear todos os dias quando me levanto pela manhã e prossegue dia afora, proibindo-me de falar na televisão e de discutir no Sala.

Se Deus me livrar dessa tontura, que deve se originar numa labirintite, voltarei a ser íntegro física e mentalmente.

Deus sabe o que me tem sido cruciante escrever minhas colunas, por sinal, mágicas colunas escritas sob tontura!

Eu peço humildemente a Deus que me faça retornar ao prazer de viver, de procurar os amigos e ser procurado por eles, de conviver com meus filhos e netos, de abraçar meu grande amigo, o meu genro Sérgio Wainer, de viver, enfim, com todos os deleites da convivência generosa com quem eu gosto e/ou gosta de mim.

Os remédios atenuam parcialmente minha tontura. Sinto que não são suficientes, por isso recorro a Deus, avô do Menino Jesus, o pai é José, avô de Maria, a mãe da Virgem é Santa Ana, por acaso e não em vão tem no seu nome o meu sobrenome.

Deus, eu preciso urgentemente perder essa tontura. Pago tudo o que tenho para me livrar dessa tontura.

Diz uma poesia que são os tontos que inventaram o amor. Não é o meu caso, nem ao amor me tenho entregue por causa dessa tontura.

No auge da tontura, por três vezes tive este auge esta semana, ele me tira a capacidade de pensar. Escrever, nem pensar.

Então, os remédios me tiram do auge da tontura mas me colocam na voltagem média da tontura. Só então volto a pensar, só então adquiro aptidão para escrever.

Para mal dos pecados, a mulher do Carlos Fehlberg, Stela, telefonou-me de Florianópolis e me disse que leu numa revista de interesse medicinal um artigo, assinado por um cientista, que afirmava no texto serem o açúcar, os doces, ingeridos em grande quantidade, os responsáveis diretos por 80% das labirintites.

Quando soube disso, jurei não mais botar na boca qualquer alimento que contivesse açúcar, confesso que os resultados foram levemente auspiciosos.

Cheguei a me lembrar dos versos de Paulo Setúbal:

Como um caboclo bem rude

Eu vivo aqui nesta paz

A recobrar a saúde

Que eu esbanjei quanto pude

Nas tonteiras de rapaz.

Só que as tonteiras de rapaz não são as tonteiras de um setentão como eu.

As tonteiras de rapaz são o estado natural, normal do espírito da rapaziada.

E a minha tonteira é algo material, palpável, nada abstrato. A minha tonteira é bêbada, fisicamente amassante, mentalmente desnorteante.

Ah, se eu pudesse me livrar dessa tontura! Seria capaz de desejar em troca que o Internacional terminasse este campeonato no G4, até isso eu daria em troca de me livrar dessa tontura.

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