sexta-feira, 27 de novembro de 2009


Jaime Cimenti

Saudades dos tempos do Zezinho

Lá pelo meio dos anos 1980, eu tinha escritório de advocacia no Edifício Itapiru, na Andrade Neves, onde, diziam, tinha mais advogado que gente. Brincadeira, claro.

Depois do almoço, uma ou duas vezes por semana, antes de voltar ao batente, eu entrava no Salão Itapiru, no térreo, me estarrava na cadeira de barbeiro do Zezinho e ele me colocava aquela imaculada toalha branca, afiava a navalha na tira de couro pendurada na cadeira, passava no assentador, me colocava umas compressas quentes no rosto para abrir os poros e, depois, um montão de espuma branca que me tornava um papai-noel.

Sem pressa, deixava a espuma agir e então, passava, lento, cuidadoso, a navalha a pelo e contrapelo, barbeando-me com apuro, escanhoando-me. Naquele tempo de Diretas Já! o Lula e o Fernando Henrique estavam no mesmo palanque e não tinha esse negócio psicanalítico de amor e ódio, rivalidade de pai e filho ou disputa de irmãos entre os dois. Espreguiçado na gostosa cadeira de barbeiro, eu tinha trinta e poucos anos e o Zezinho deveria ter uns cinquenta. Éramos jovens.

Os apagões da CEEE, que uns chamavam de Companhia Encarregada de Escurecer o Estado, eram bem explicados e não como esse apagão cheio de versões e mistérios que anda por aí. Era um tempo de conversas menos complicadas e de menos versões. Tempo de papos cordiais e educados de barbearia, sobre o tempo, o futebol, a política, os crimes, as mulheres e demais assuntos palpitantes do dia.

Eu só não sesteava na cadeira por que, senão, poderia provocar algum acidente com a navalha. Era relaxante e civilizado aquele ritual, com momentos de meditação, silêncio e sem necessidade de lâminas descartáveis. O Maneca, do salão Nova Era, da Andrade Neves 18, me informou que o Zezinho está em Tramandaí, em atividade. Hora dessas vou lá.

Depois do barbear, Zezinho me lavava o rosto com água morna, secava com uma toalhinha e me passava no rosto, com tapinhas meio carinhosos, Ácqua Velva, talco, álcool ou coisa assim. Em caso de algum pequeno sangramento, usava pedra-pomes.

Sei, vocês podem achar que estou saudosista, ficando velho, com saudades dos meus trinta e poucos e daqueles tempos mais pacíficos e menos velozes, mas em alguns lugares ainda existem barbearias e barbeiros parecidos.

Em São Paulo inauguraram uma barbearia no velho estilo, só para homens, com móveis e clima antigos e tal. Sempre é tempo de inaugurar ou reinaugurar pensamentos e momentos bons. Aguarda-me aí em Tramanda, Zezinho! Lâmina descartável, chope e casquinha de siri. Abraço!

Uma ótima sexta-feira e um excelente fim de semana pra você.

Nenhum comentário: