A produção tinha pelo menos dois grandes desafios. O primeiro era ser fiel à imaginação do autor. O segundo era conseguir ser infiel na medida certa, admitindo-se que é impossível transformar palavras em imagens sem arriscar-se para além dos limites da obra original. Em se tratando de uma plataforma de streaming global como a Netflix, o maior perigo era Macondo ficar mais parecida com um hotel temático de Las Vegas do que com Aracataca, povoado no norte da Colômbia onde García Márquez nasceu.
Não foi o que aconteceu. Da escolha do elenco à direção de arte, passando por cada detalhe do figurino e dos cenários, tudo contribuiu para que o espectador ficasse com a sensação de que a alma colombiana da história estava sendo respeitada.
Com relação à adaptação do romance, o resultado me pareceu não apenas respeitoso, mas de certa forma até mesmo complementar. Em geral, onde a literatura toma todo o tempo necessário para contar uma história, séries e filmes costumam pisar no acelerador, sem se preocupar muito com o que se perde pelo caminho. Neste caso, me parece ter acontecido o contrário.
Se Cem Anos de Solidão é um romance que se lê quase perdendo o fôlego a cada página, tantas coisas acontecem e tão poucos intervalos para observar a vida interior dos personagens a trama oferece, a série, em comparação, se desenrola em câmera lenta, dando oportunidade para o espectador demorar-se um pouco mais em cada desdobramento da história.
Para quem, como eu, gostou da série e mal pode esperar pela segunda e última temporada (ainda sem data de estreia definida), minha sugestão é aproveitar o momento "soy loco por ti, América" para assistir à adaptação de outro clássico latino-americano que estreou há pouco no catálogo da Netflix, ainda que sem tanto alarde: o filme Pedro Páramo, baseado na obra do escritor mexicano Juan Rulfo. Um livro que inspirou, entre tantos outros autores, o próprio García Márquez.
CLÁUDIA LAITANO
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