25 de fevereiro de 2014
| N° 17715
LUÍS AUGUSTO FISCHER
Os ovários das personagens
Um dos vários livros que aguardam
leitura, em pilhas que curto muito visitar aqui em casa, finalmente ganhou o
primeiro lugar na corrida imaginária pela disputa do meu escasso tempo. Ainda
não terminei de percorrer suas páginas e já o admiro para sempre. Trata-se de
Os Ovários de Mme. Bovary, de David e Nanelle Barash (são pai e filha),
traduzido por Cláudio Figueiredo para a agora extinta Relume-Dumará, do Rio
(edição de 2006). O subtítulo ajuda a entender a piada do título: “um olhar
darwiniano sobre a literatura”.
Gente com formação em biologia
mexendo com literatura? Pois é: uma beleza. Oferecem momentos de grande
iluminação, ainda mais quando escritos, como é o caso, por gente que não quer
acabar com a conversa letrada ou humanista, mas espera acrescentar novas
percepções.
Os Barash oferecem uma série de
leituras encadeadas sobre clássicos da literatura, desde gregos até
Shakespeare, Dostoiévski a Phillip Roth, Steinbeck e Mario Puzo. E Flaubert,
naturalmente. O que fazem é ler comportamentos de personagens segundo
regularidades já detectadas e explicadas pelos evolucionistas.
Por exemplo: o ciúme de Otelo (ou
de Bentinho, que os Barash não conhecem, nem sabem o que perdem) terá a ver
diretamente com a insegurança ancestral dos machos em relação à paternidade.
Por mais lustrado que seja o homem, há nele uma antiga dúvida, que nosso DNA
está programado para manter alerta. Quanto aos mencionados ovários, bem, a sra.
Bovary parece ter seguido um velhíssimo procedimento de fêmeas, galgar um
degrau nas relações com as demais criaturas do bando ao preferir o macho bonito
e forte ao feio e fraco.
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