quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014


20 de fevereiro de 2014 | N° 17710
L.F. VERISSIMO

O alarme

Quem viu o filme de Stanley Kubrick 2001 – Uma Odisseia no Espaço se lembra do monólito, aquela pedra lisa encontrada por astronautas em Júpiter que se revela estar ali há milhões de anos como uma espécie de alarme. Sua descoberta por terrenos significaria que essa raça predatória e assassina já tinha a capacidade técnica de invadir, e fatalmente envenenar, o Universo. O monólito era um aviso. Esta interpretação não fica clara no filme, mas o título do conto de Arthur C. Clarke no qual Kubrick e o próprio Clarke basearam seu roteiro é O Sentinela.

Haveria um momento na vida das pessoas ou das sociedades em que funcionaria um alarme parecido com o que alertou o Universo para a chegada dos temíveis humanos, no filme. Pode-se especular sobre qual seria esse momento para um judeu na Alemanha, nas primeiras manifestações do nazismo, por exemplo. Seria a pregação racista do partido mesmo antes de assumir o poder? Seria o que já se sabia do pensamento de Hitler e outros teóricos do fascismo? Qual o exato instante em que esse hipotético judeu se convenceu de que era preciso fugir do holocausto que se aproximava?

Para muitos, o aviso nunca veio, ou veio tarde. Muitos não acreditaram que o nazismo chegaria ao poder e depois aos seus excessos. E pagaram por não reconhecer o momento. Demorou algum tempo para que o resto do mundo se desse conta do que estava acontecendo na Alemanha nazista.

O fascismo foi visto como um bem-vindo antídoto para a ameaça comunista. Já havia perseguição a judeus e outras minorias no país e a companhia Ford continuava fazendo negócios com a Alemanha – e continuou a fazer negócios depois do começo da guerra. Henry Ford era um notório antissemita, mas os produtores de Hollywood que desencorajavam críticas ao regime de Hitler nos seus filmes para não perder o mercado alemão eram todos judeus. Nenhum reconheceu o momento.


Na falta de um sentinela para nos alertar de que os bárbaros estão tomando conta, resta confiar no nosso instinto. Quando chegará o momento que nos convencerá de que isto aqui não tem jeito mesmo, e a procurar uma saída? Será que o momento já veio e já foi e nós não notamos? E sair pra onde? Pra dentro, para a alienação e a burrice induzida, ou para fora, com o euro caro desse jeito?

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