11 de fevereiro de 2014 | N° 17701
DAVID COIMBRA
Sozinha
no apartamento
Se quando você está sozinha, com nada para fazer, apenas
você consigo mesma, quieta, sem a distração da luz azul da TV ou de uma
conversa inconsequente no Facebook, sem falar com sua mãe ao telefone ou fazer
a aflitiva conta das despesas do mês, se, nessa situação, você sente um ponto
de apreensão pressionando-lhe o meio do peito, sente que algo pode estar
errado, que algo não saiu como deveria ter saído, bem, então algo deve estar
errado, algo não saiu como deveria ter saído.
Porque a vida não é reta e o destino não está escrito. A
vida é surpreendente, sim, ela segura você pelos ombros quando você queria
seguir em frente, e empurra você para um desvio do caminho quando você
pretendia continuar no asfalto seguro da estrada principal, a vida faz tudo
isso, verdade, mas é você quem toma as decisões. E muitas, muitas decisões são
equivocadas.
Você deve ter humildade para reconhecer seus erros, garota.
Mesmo que não possa voltar atrás, é importante para você saber que poderia ter
sido diferente, e então, na próxima decisão, talvez você seja mais sensata.
Talvez você cresça.
Ou não.
Do que estou falando, nessa terça-feira quente?
Do Gre-Nal de domingo, é claro. De Luan, que, se não é uma
garota no recôndito do seu apartamento, ao contrário, é um galalau que parece
ter metro e noventa de altura, mas tem menos, é um latagão, um mocetão, para
usar adjetivos do Eça, esse Luan errou, e precisa saber que errou. Será bom
para ele esse conhecimento.
Ou não.
Luan pode se tornar um ótimo jogador de futebol, quando aprender
a jogar futebol. Ele tem tudo para isso. Tem até o amor da torcida do Grêmio e
a complacência de quem o vê com a bola nos pés. Luan saiu aplaudido no Gre-Nal
e ninguém disse que ele foi o responsável pelo gol do Inter.
Mas foi.
Culparam o Pará, coitadinho do Pará. Compreensível. Pará não
tem a presuntiva habilidade de Luan, é um lateral-direito esforçado, nada mais
do que isso. No lance do gol, Pará estava atento feito um dobermann. Marcava um
jogador importante do Inter, Jorge Henrique, para quem a bola foi endereçada.
Mas a bola passou por Pará e Jorge Henrique, seguiu deslizando em diagonal,
área adentro, e foi parar nos pés de Fabrício, que estava sozinho, pronto para
fazer o gol, como fez.
Todos disseram que Pará deveria estar marcando Fabrício. Mas
como, se ele estava marcando Jorge Henrique? Se Pará estivesse marcando
Fabrício, Jorge Henrique receberia a bola com liberdade e faria o gol. Pará,
inteligente e visionariamente, adiantou-se para bloquear o jogador que iria
receber a bola.
Luan, que vinha molemente da intermediária, acompanhando o
lance, ficou a quatro ou cinco metros de Fabrício, observando-o ingressar
lampeiro na área. Não sei se Luan tinha ordens de acompanhar o lateral do
Inter. Não importa. Naquele momento, sua obrigação era correr para não deixar o
adversário livre. Luan não fez isso por desídia ou distração, e seu time levou
o gol.
A culpa foi dele. Se aprender com o lance, talvez cresça e
se transforme em um grande jogador. Se não aprender, talvez seja só mais um dos
tantos que estão dentro de chuteiras por aí. Cabe a Luan escolher o que vai ser
na vida, e ele tem tudo para escolher ser grande, em vez de ser apenas mais um.
Ou não.
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