sábado, 22 de fevereiro de 2014


22 de fevereiro de 2014 | N° 17712
AFLIÇÕES AMOROSAS

ANTES DA CATÁSTROFE

Para descobrir a fronteira entre o ciúme dito normal e o patológico, é preciso prestar atenção no comportamento do parceiro, e colocar limites desde o início da relação. Conforme a psicóloga Marina Vasconcellos, muitas vítimas de ciumentos ou ciumentas acabam cedendo às pressões para evitar brigas momentâneas, o que pode, a longo prazo, alimentar ainda mais este comportamento doentio:

– O resultado é catastrófico, pois quando menos imaginar perceberá o quanto está agindo em função do outro e se deixando de lado, submetendo-se, anulando-se por completo.

A recomendação é sempre conversar com o companheiro ou a companheira, mostrar o quanto as cobranças podem afetar a relação e destacar a importância de cada um ter seu espaço, seus amigos e sua liberdade. Caso o ciúme permaneça e continue perturbando o relacionamento, pode estar na hora de buscar ajuda profissional.

Já para os ciumentos, especialistas recomendam sempre parar para refletir quando o sentimento aparecer. Tentar entender a origem do ciúme pode ajudar a controlá-lo. Neste momento, o ciumento deve se perguntar se a tensão foi desencadeada por insegurança, por um fato real, ou até por alguma experiência de traição anterior.

– Quando o individuo ciumento reconhece que o problema tem origem interna, a ajuda profissional pode ser extremante útil. Quando o sujeito acredita que a origem é só externa, isto é, que ele tem razão para ter ciúme, geralmente não aceita ajuda profissional e a relação tende a degastar e até terminar – resume o psiquiatra e psicanalista Marco Antonio Pacheco.

O ciúme é demais quando...

- Começa a trazer problemas para a rotina de quem o sente (como dificuldades de concentração no trabalho, no estudo e nas relações sociais)

- A pessoa se sente mobilizada e limitada apenas para e pelo ciúme (quando deixa, por exemplo, de ir a lugares ou fazer coisas apenas em função desse sentimento)

- Passa a ter ideias que não correspondem à realidade (como fantasias de traição com o parceiro)

- Torna a pessoa capaz de agredir o parceiro (verbal e fisicamente)

- Deixa o relacionamento insuportável pela tentativa de controle do parceiro em tudo o que ele faz: a pessoa checa as mensagens do celular, quer saber quem enviou e-mails, não permite que o outro frequente qualquer evento social sem sua presença, afasta o parceiro de seus amigos por desconfiar de toda e qualquer relação de amizade que ele possa ter

Como lidar?

- Quando o ciumento é o parceiro...

- Deixe claro que está percebendo o ciúme

- Informe, de maneira clara, porém gentil, que isso está prejudicando a relação de vocês

- Lembre-o de situações ou afirmações nas quais ele demonstrou ciúmes e mostre porque ele estava equivocado ao sentir isso

- Peça que ele fale com outras pessoas sobre suas atitudes

- Se achar necessário, sugira que ele procure ajuda psicológica

- Diga o que está sentindo em conversas periódicas sobre a relação

- Preste atenção no que seus familiares e amigos dizem sobre suas atitudes em relação a seu parceiro

- Converse com seu parceiro e veja como ele está se sentindo diante de suas crises de ciúme

- Tente controlar seus impulsos e pense em por que está sentindo isso

- Pense sobre suas relações anteriores e procure identificar se era ciumento antes da relação atual

- Considere a possibilidade de buscar ajuda profissional para aprender a lidar com seus sentimentos

Além da ficção

“Tenho 72 anos e sou casada há 50. Quando jovem, fui morar no interior do Rio Grande do Sul, onde conheci meu marido. Namoramos por dois anos. Ele era atencioso, me dava presentes e era apaixonado. Logo depois que casamos, comecei a notar comportamentos estranhos. Ele era muito ciumento, não me deixava ter amigos, nem mesmo conversar com o marido de colegas de trabalho. Tentei cursar faculdade, mas ele entrava na sala e gritava comigo, me carregava de volta para casa.

Tive de largar o trabalho também, pois não podia ter contato com ninguém. Chegou a acreditar que eu tinha um caso com a nossa empregada. Ele ficava violento, já chegou a quebrar minhas costelas, me arrastar pelo cabelo. Como eu tinha vergonha de contar para a minha família, escondia de todo mundo. Fiquei muito sozinha e deprimida, não saia mais de casa. Lá pelos 40 anos, comecei a procurar ajuda para entender o que acontecia. Tivemos três filhos que, até hoje, têm sequelas psicológicas pelo comportamento do pai.

Meu marido já foi retirado de casa pela Brigada Militar, internado algumas vezes e ainda toma muitos medicamentos para controlar a doença. Hoje eu entendo que fui vítima de um ciumento patológico.”

“Eu me achava normal até os 17 anos, quando comecei a namorar um rapaz de 20. Ele estudava à noite e eu comecei a imaginar as gurias dando em cima dele e ele correspondendo. Sofria calada, mas, aos poucos, fui extravasando meu ciúme, perguntava sobre as colegas, o que conversavam, telefonava sem parar e, se ele não atendia, eu ligava para os amigos dele. Brigávamos muito, ele cansou e rompeu o namoro. Só voltei a namorar aos 20 anos e tudo se repetiu.

Entrava no computador dele e não achava nada de concreto, mas tudo me irritava, até um alô simpático de uma amiga. Ele também rompeu comigo. Procurei ajuda profissional. Quando era criança, minha mãe seguia meu pai de carro e levava eu e minha irmã. Ela jurava que ele tinha uma amante, assisti muitos escândalos e, somente com a terapia, comecei a questionar se ela também não tinha ciúme patológico. Hoje tenho 26 anos e ainda sofro. Estou num relacionamento sério há dois anos, converso muito com meu terapeuta sobre meu ciúme. Aprendi a primeiro desconfiar da minha desconfiança.”


*Os nomes foram omitidos para preservar a privacidade das entrevistadas

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