12 de fevereiro de 2014
| N° 17702
MARTHA MEDEIROS
A conexão perdida
Para se estressar, hoje, não é
preciso muito. Basta que a pessoa se hospede numa pousada que não tenha wi-fi,
ou que haja uma queda de energia que deixe seu computador paralisado: que
desespero ficar sem o Instagram, o Face, o Twitter, o YouTube, o Google.
É chato, eu sei. Mas há uma
conexão muito mais séria que está sendo perdida sem que ninguém se importe: a
conexão entre causa e consequência, que exige apenas o bom funcionamento dos
fios que interligam os neurônios.
Quem viu as imagens do rojão que
atingiu o cinegrafista Santiago Andrade durante um protesto no Rio reparou que
ele não estava cercado por muita gente, havia um clarão ao seu redor, o que
resultou num comentário paralelo à comoção geral: alguns consideraram a
tragédia um azarão. Não era para acertar ninguém, foi uma fatalidade.
Que azar, o quê. Não foi azar de
quem soltou o artefato, nem azar de quem estava no caminho. Não houve azar ou
sorte. Houve, mais uma vez, a falta absoluta de conexão entre causa e
consequência, uma relação lógica que entrou em desuso.
Quem lida com material explosivo
no meio da rua (ou dentro de um estádio, como aconteceu no ano passado num jogo
do Corinthians, na Bolívia) tem que estar ciente de que pode ferir e até matar
outros. Quem dirige feito um insano na estrada tem que ter noção de que pode
provocar um acidente fatal. Quem depreda um ônibus tem que lembrar que aquele é
o mesmo ônibus que o levaria ao emprego no dia seguinte.
Quem se descontrola com gastos
estapafúrdios tem que responder pela falta de verba para o essencial. Quem
pensa que está fazendo economia ao usar material de baixa qualidade em obras de
infraestrutura tem que considerar que poderá haver danos, atrasos e acidentes
de trabalho. Quem se envolve com corrupção tem que saber que é um ladrão como
qualquer outro, não importa se usa gravata e tem curso superior.
Quem não atende com eficiência vê
sumir a freguesia. Quem solta boatos obstrui a comunicação. Quem mente perde a
credibilidade. Quem não investe não avança. Quem só cultiva aliados em vez de
amigos fica sozinho. Quem não lê não pensa direito. Quem não pergunta tateia na
ignorância. Quem mima em vez de educar lega ao mundo seres prepotentes. Quem
não entendeu que gentileza gera gentileza acabará sentindo na pele que
grosseria gera grosseria.
Mas, em vez de manter conectada
essa corrente óbvia entre causa e consequência, o que vemos são políticos
governando o hoje como se não houvesse amanhã, manifestantes confundindo
consciência com delinquência, motoristas desrespeitando as leis para chegar
antes, homens e mulheres procurando resolver seus problemas com imediatismo,
sem levar em conta as necessidades e sentimentos dos outros.
Apagão é isso.
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