segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014


24 de fevereiro de 2014 | N° 17714
PAULO SANT’ANA

Cobrador de bonde

Os jornais frisam sempre que o presidente Nicolás Maduro já foi cobrador de ônibus.

Então eu me lembro dos cobradores de bonde em Porto Alegre. O método usado então, lá pela década de 50, era inédito. É que havia duas plataformas nos bondes, a dianteira era onde manobrava o motorneiro.

A plataforma traseira, quando o bonde chegava no fim de linha, se transformava em dianteira, o bonde voltava sem fazer a curva pelos trilhos.

Ocorre que o controle de pagamento das passagens não era mecânico: um fiscal vinha da traseira do bonde até sua dianteira contando os passageiros, essa tarefa era muito estafante quando o bonde estava lotado, o fiscal se esgueirava entre os passageiros e os ia contando.

Quando a viagem chegava ao fim, o fiscal anotava o número de passageiros numa planilha encostada a uma tabuazinha. O cobrador de ônibus tinha de dar conta do número de passageiros, não havia controle eletrônico nem mecânico, era tudo na confiança. O cobrador, se o número não era exato, caso fosse exagerado, tinha de pagar a diferença.

Calculo que os cobradores não tinham prejuízo, pelo contrário, faturavam um lucro pequeno, não fosse assim e pediriam demissão. E eles não pediam, eram sempre os mesmos.

Para checar esse sistema, havia além do cobrador e do motorneiro, uma série de fiscais, subinspetores e inspetores, uma parafernália hierárquica que se amontoava nas plataformas.

Muito convivi com essa hierarquia quando fui menino, pois pegava carona nos bondes no fim da linha Partenon e descia no Hospital São Pedro, uma parada depois, fugindo do cobrador e me atirando do bonde em movimento, muitas vezes veloz. Para isso, eu tinha adquirido a técnica de descer do bonde em movimento mediante um contrapasso medido no ar e sempre com sucesso.

Os bondes trafegaram em Porto Alegre desde 1864. Até 1970. Fizeram parte poética da cidade, havia bondes grandes e alguns menores, denominados de gaiola porque eram sacolejantes.

Naquele tempo, o único tipo de delinquentes que havia na cidade eram os batedores de carteiras, exímios em penetrar nos bondes lotados e, ao se encostarem nos passageiros, surrupiarem suas carteiras de dinheiro, utensílios muito usados à época.

Foi um tempo delicioso aqueles dos bondes aqui na Capital.

Minha lembrança dos bondes delicia as minhas recordações.

Erradamente, está provado, extinguiram os bondes por aqui.

Ia me esquecendo de dizer que o sinônimo de bonde era elétrico, eis que uma alavanca com roldana ia do bonde até um fio elétrico, o que o movimentava. Portanto, a grande vantagem do bonde para os ônibus é que o primeiro não tinha combustível.


Por que acabaram com os bondes?

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