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domingo, 23 de novembro de 2008
NAOMAR DE ALMEIDA FILHO
O fim do mestrado...
Quais os antecedentes dessa invenção da burocracia acadêmica brasileira? A que fins serviu? Servirá no futuro?
...TAL COMO introduzido no Brasil, durante a ditadura militar, parece próximo.
Na atualidade, praticamente todos os países com maior desenvolvimento econômico e social têm mestrado como formação profissional.
Entre nós, o grau universitário chamado mestrado foi instituído em 1965 pelo famoso Parecer Sucupira, que definiu diretrizes para a pós-graduação brasileira. Nesse contexto, o título foi criado como habilitação à docência em nível superior.
Quarenta anos depois, tal definição só existe no Brasil e, em menor escala, em alguns países latino-americanos. Quais são os antecedentes dessa invenção da burocracia acadêmica brasileira? A que fins serviu? Servirá no futuro?
O termo "master", "meister" (daí o tratamento plebeu -"mister"- na língua inglesa), "maître", mestre, em português, tem raízes profissionais. Na Europa medieval, designava o artesão experiente que dominava seu ofício e, autorizado pelas corporações, estava apto a formar aprendizes.
A universidade formava então apenas "doctors", senhores da "doctrina". Só na era moderna começou a titular profissionais. A Reforma Humboldt, instituidora da universidade de pesquisa em 1810, manteve o doutorado como láurea acadêmica maior. Mas acolheu o mestrado como grau acadêmico intermediário, em suplemento à láurea menor, o bacharelado.
A partir do século 20, em toda a América do Norte e nos países da "commonwealth", o título de "master" tanto se refere à formação pré-doutoral quanto implica designação direta da área profissional.
O administrador recebe o título de MBA ["master of business administration"]; o pedagogo, M.Ed. ["master of education"]; o sanitarista, M.P.H. ["master of public health"]; o psicólogo, M.Psychol. ["master in psychology"]; e assim por diante.
Exceções são algumas profissões que seguem o padrão da medicina, em que graduação [M.D. -"medical doctor"] é sempre doutorado. E, em muitas universidades, o curso de direito concede grau de J.D. ["juris doctor"].
Na tradição mediterrânea, raiz da universidade brasileira (através de Coimbra e depois pela influência da Sorbonne e das "écoles polytechniques"), o título mestre nunca foi utilizado. Preferia-se licenciado (modelo francês e espanhol) ou bacharel (modelo lusitano).
Com o Processo de Bolonha, a partir de 1999, unifica-se o mestrado como diploma do segundo ciclo na maioria das universidades européias. Em Portugal, Holanda e Suíça, por exemplo, médico é agora mestre em medicina.
Na França, Alemanha e Itália, cursos em complemento às láureas profissionais são igualmente referidos como mestrado.
Neste contexto de crescente internacionalização da universidade, vale a pena continuarmos sucupiranos?
Faz sentido manter no Brasil uma exótica licenciatura para ensino superior chamada mestrado? Não seria interessante "masterizar" a formação profissional, com soluções criativas para impasses e limites dos modelos internacionais?
Respostas a essas questões podem ser dadas pelo Reuni, pelo menos no âmbito da rede federal de ensino superior. No plano nacional, a Andifes avança na construção do chamado "Reuni da pós", que deve contemplar ampliação maciça de vagas e propostas de reestruturação dos ciclos pós-profissionais. No plano local, várias universidades desenvolvem modelos de pós-graduação compatíveis internacionalmente.
Assim é que vimos implantando na UFBA o modelo conhecido como Universidade Nova, que, além dos bacharelados interdisciplinares, prevê expansão dos mestrados profissionais (devidamente redesenhados) e equivalência entre essa modalidade e cursos de especialização.
No marco legal superado da pós-graduação brasileira, mestres formados no exterior em graduação profissional têm sido oficialmente credenciados por colegiados e câmaras como docentes de nível superior. Haverá certamente reação às mudanças entre os que se beneficiaram do equívoco regulatório.
Mas, para recriar a pós-graduação brasileira, contamos enfim com os órgãos normativos e de coordenação da educação superior.
O Conselho Nacional de Educação poderia rever o Parecer Sucupira, e todo o marco legal derivado, à luz das mudanças em curso em praticamente todos os países do mundo desenvolvido.
E a Capes, formada por representantes das comunidades acadêmicas, poderia elaborar diretrizes específicas para os mestrados profissionais, fomentando propostas capazes de tornar a universidade brasileira mais integrada às redes internacionais de produção e circulação de ciência, arte e cultura.
NAOMAR DE ALMEIDA FILHO , 56, doutor em epidemiologia, pesquisador do CNPq, é professor titular do Instituto de Saúde Coletiva e reitor da UFBA (Universidade Federal da Bahia).
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