terça-feira, 25 de novembro de 2008



25 de novembro de 2008
N° 15800 - MOACYR SCLIAR


Imperialismo brasileiro?

O veterano correspondente da revista Newsweek no Brasil Mac Margolis acaba de publicar um artigo que deve ser motivo para reflexão.

Durante muito tempo, diz Margolis, os latino-americanos viram nos Estados Unidos o alvo preferencial de seu nacionalismo. Mas, com os americanos envolvidos em conflitos noutras regiões (e às voltas com a crise financeira), o alvo mudou. Os imperialistas, diz Margolis, agora falam português; o país imperialista é o Brasil.

A matéria lista os possíveis porta-vozes desta acusação: Hugo Chávez, Evo Morales, Fernando Lugo, e, mais recentemente, o presidente do Equador, que no último fim de semana esteve nas manchetes dos jornais brasileiros por causa da briga com a Odebrecht, que construiu naquele país uma grande usina hidrelétrica, com financiamento de a US$243 milhões emprestados pelo BNDES.

A hidrelétrica teve muitos problemas; o governo equatoriano expulsou do país a Odebrecht, e entrou com uma ação internacional para suspender o pagamento da dívida contraída com o BNDES.

O Brasil acabou chamando seu embaixador em Quito, clássica maneira de demonstrar desagrado. Se acrescentarmos a esta conjuntura a briga paraguaia (Itaipu, demonstrações contra os brasiguaios), teremos um quadro que, aparentemente ao menos, fundamenta as ponderações de Margolis.

Mas de que estamos falando, quando falamos em imperialismo? O termo ganhou força no começo do século 20, graças aos teóricos marxistas, e sobretudo graças a Lenin.

Até então, a luta da esquerda e do nacionalismo era contra o colonialismo, que implicava a presença, numa região, de uma potência dominante, com aparato governamental e exército; mas isto foi superado por uma nova, e mais prática, forma de domínio econômico e político:

o capital financeiro monopolístico entrava num país e passava a controlar a produção. Aí emerge a grande potência imperialista, os Estados Unidos.

Agora: ver o Brasil como sucessor dos americanos em termos de “imperialismo” é bobagem. Para começar, a comparação está cheia de contradições.

Margolis assinala a popularidade de que goza Lula no continente, inclusive entre os presidentes nacionalistas, como Chávez e Evo. Claro, em termos regionais, o Brasil, com uma economia de US$ 1,4 trilhões e uma agenda política global, é uma potência. Mas a Argentina também é uma potência em relação ao Uruguai, por exemplo.

Se diferenças de tamanho começarem a gerar conflitos (num processo no qual o ressentimento e a inveja sem dúvida desempenham um papel, ainda que emocional), estaremos bem arranjados. Só falta vermos desfiles de gente carregando cartazes tipo “Brasileiros, go home”.

Tudo isto serve para mostrar a confusão ideológica em que vive nosso mundo, um mundo no qual os rótulos clássicos, tipo esquerda e direita, foram para o espaço. O protesto fanático, contudo, sempre precisa encontrar um alvo, mesmo que para isso tenha de sacrificar a racionalidade.

Conseqüência: com crise e tudo, a indústria das bandeiras sempre terá demanda, porque sempre haverá alguém querendo queimá-las em praça pública (as bandeiras americanas que o digam). A bandeira brasileira por enquanto escapou a este destino. Esperemos que continue assim.

Fantástica dupla de nomes que condicionam destinos: dois governadores, Ivo Cassol, de Rondônia, e Cássio Cunha de Lima, da Paraíba, sofrem cassação, ambos por compra de votos. Cássio e Cassol, cassados? Só podia, né? Só podia.

Olhando as cenas sombrias da catástrofe em Santa Catarina, na qual pessoas perderam familiares e seus poucos pertences, uma conclusão se impõe: às vezes a gente se queixa de pouco. De muito pouco.

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