quarta-feira, 26 de novembro de 2008



26 de novembro de 2008
N° 15801 - DAVID COIMBRA


Quanto vale um bigode

Ofendi uma mulher por causa do bigode, certa feita. O episódio valeu-me alguns ensinamentos acerca da vida, das pessoas, dos leitores e do momento da Dupla Gre-Nal. Mas foi sério. Por Deus. Aconteceu assim:

Um dia o Cássio, da portaria aqui do prédio da Zero, deixou crescer o bigode. Cheguei ao jornal, olhei para o Cássio e comentei:

– Bigode?

Ele me enviou um sorriso sardônico, cheio de significados duplos e até alguns triplos, balançou a cabeça devagar, cofiou o dito cujo e respondeu: – Rá!

Entendi o que ele queria dizer. Era: “Sim, deixei crescer o bigode porque o bigode trata-se de um símbolo atávico de masculinidade e, sendo assim, atrai as fêmeas da espécie, o que fará com que eu tenha maior chance de sucesso amoroso e, desta forma, seja mais feliz, porque, como Freud já ensinou, tudo na vida é casa, comida e sexo”.

Agora: embora tenha compreendido em sua plenitude o rá do Cássio, não concordava com ele. Porque, pelo que tenho observado das mulheres contemporâneas, elas desaprovam o uso do bigode.

Algumas até o desprezam, considerando-o ridículo, ultrapassado e cosquento. Naquele mesmo dia, escrevi a respeito. Disse que o bigode não tinha mais lugar sob as narinas do século 21.

E, no dia seguinte, recebi aquele imeil fulo. Indignado, até. Pensei que fosse brincadeira, que ninguém, sobretudo uma mulher, se enfureceria comigo por eu ter falado mal do bigode. Mas não: ela estava revoltada mesmo. Realmente a ofendi com minhas críticas ao bigode.

Pedi desculpas, garanti que não era minha intenção agredir ninguém ao menoscabar o bigode, que, afinal, não passa de simples adereço peludo do rosto do homem. Não adiantou. Ela jurou que jamais me perdoaria.

Bem. Os meses se passaram, o Cássio tirou o bigode, a vida seguiu seu rumo inexorável. Dias atrás, recebi outro imeil daquela paladina dos bigodes assacados. Relembrou o episódio e reafirmou seu ódio eterno por mim.

Por coincidência, no mesmo dia o Cássio... apareceu de bigode! Mas desta vez contive-me. Lembrei da defesa feroz do bigode empreendida pela leitora e resolvi observar o que mudava na vida do Cássio com mais pêlos no rosto. E não é que mudou?!?

As mulheres assumiram outro comportamento com ele. Tornaram-se mais lânguidas e atenciosas. Eu passava pela portaria e sempre via alguma delas liqüefazendo-se ao pedir o crachá para o Cássio. Então, olhava-o de soslaio e ele me olhava de esguelha e de novo cofiava o bigode e repetia: – Rá!

Outra vez aquele rá. Mas tem o seguinte: tenho certeza de que não é o bigode em si a razão do sucesso do Cássio. É a confiança que ele exala tendo cabelos sobre os lábios. As mulheres sentem que ali está um homem seguro e se aproximam dele por isso.

Se ele é tão seguro, deve haver algum motivo, entende? O princípio da publicidade. Se você repete que é bom, é bom, é bom, provavelmente seja. As pessoas acreditam na publicidade, o que é muito surpreendente.

O contrário também vale. O homem afoito, as mulheres pressentem sua ansiedade e correm dele.

Eis o segredo do bigode: mesmo estando fora de moda, confere personalidade a quem o usa com convicção, casos clássicos de Rivellino e Olívio Dutra.

A personalidade é atraente, a personalidade faz toda a diferença. Pessoas têm que ter personalidade, assim como cidades e times de futebol e jornais e tudo mais.

Os times da Dupla de 2008 não têm personalidade. Abatem-se com qualquer revés. Lembro de times da Dupla que tinham personalidade. Porque tinham jogadores como um Figueroa, que ensinava:

– Vitórias não se merecem; se conquistam. Ou um Oberdan, que em 1977 prometeu:

– Neste time ninguém vai chorar quando formos campeões. Personalidade. Não se tem só com bigode, mas, se o bigode ajudar, por que não?

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