quinta-feira, 13 de novembro de 2008



13 de novembro de 2008
N° 15788 - LETICIA WIERZCHOWSKI


Do nosso egoísmo

O homem é o câncer do planeta, li isso em algum lugar. Triste, mas justa afirmação – vide o fato de que nos espalhamos freneticamente pelo globo terrestre devastando tudo quanto encontramos pela frente. No entanto, agora a raça humana depara com um terrível dilema, o cansaço incontornável do planeta.

Centenas de anos de consumo dos bens renováveis e não-renováveis, uma orgia com os recursos terrestres, e agora, logo na nossa vez, a Terra dá visíveis sinais de que não agüenta mais o tranco.

Teria sido ótimo se a gente pudesse seguir vivendo doidamente, deixando nosso lixo como um testamento para as gerações futuras, e despejando dióxido de carbono à toa por aí. Mas a coisa ficou feia.

Ou reformamos nossos conceitos, nossas empresas e nossos hábitos cotidianos, ou vamos todos pro beleléu. É sabido que reformar é mais trabalhoso do que começar do zero, mas não tem jeito. Temos que pegar aquele hábito ano 2000 e reduzi-lo a um modelito anos 70 urgentemente.

Temos que fazer uso da nossa condição de consumidores de maneira consciente e política – produtos com embalagens recicláveis, empresas que protegem o meio ambiente: gaste seu dinheiro com eles.

E temos que desperdiçar menos água! Nem eu, nem você podemos colocar no mercado um carro a hidrogênio, mas podemos fechar a torneira ao escovar os dentes.

E podemos usar a vassoura. Isso mesmo, ao invés de limpar a calçada com uma mangueira, vamos a la Janio Quadros. Vassourinha nela! Aliás, lavar a calçada de mangueira deveria ser passível de multa.

Então, dia desses, estou num restaurante e vou ao banheiro. Em frente ao reservado, uma mulher mirava-se no espelho e aplicava batom nos lábios com a torneira aberta.

Isso mesmo: enquanto ela se enfeitava, a água corria pelo cano sem necessidade nenhuma. E a criatura lá, fazendo caras e bocas pra agradar o segundo marido ou sei lá quem era o coitado que a esperava na mesa.

E era uma mulher bem-vestida num restaurante da moda. Ou seja, ela pelo menos conhecia a moda, e deve ler umas revistinhas aqui e ali, nem que seja no cabeleireiro. Ela sabia que aquela água correndo era uma afronta à realidade.

Que metade das pessoas desse planeta já sofrem com a escassez de água potável. Mas e daí, se era domingo e ela tinha tomado umas tacinhas de champanhe?

Daí que o nosso egoísmo é que vai nos afundar. Ou nos afogar, se os oceanos subirem como previsto.

Mas tudo bem, desde que a gente ainda possa andar mais um tempo com o carro do ano, comprar todo o guarda-roupa do próximo inverno, e terminar aquela última garrafa de champanhe que ficou nos esperando ali na mesa do restaurante.

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